por André Henrique M. V. de Oliveira

(Professor de filosofia/IFPI e fã de Bob Dylan)

 

É possível conhecer alguma coisa sem que se tenha um cérebro? Para os “enativistas” a resposta é “sim”.  De imediato, é provável que isso nos soe absurdo, ou no mínimo estranho. Então uma planta sabe? Os primeiros coacervados sabiam?

Refutar a ideia de que é plausível comparar um computador à mente humana: eis um dos propósitos dessa teoria. Na perspectiva enativista, um computador não é comparável à mente de um ser vivo pela mesma razão que o pé de jambo sabe, e que “a ciência da abelha e da aranha muita gente desconhece”: a característica essencial dos seres vivos, com sistema nervoso ou sem, é que eles são capazes de atribuir significado ao mundo.

O que é atribuir significado, senão o saber diferenciar, distinguir? No nosso caso, que talvez não seja o da aranha e o do pé de jambo, essa capacidade de diferenciar vem acompanhada do pensamento, e para isso precisamos de um cérebro. Mas, no fundo, a atitude de um ser humano de buscar alimento é semelhante à de uma planta crescer buscando luz: ambas resultam da atribuição de significado, do saber, do sapere, do saborear o mundo.

Dar significado à alguma coisa quer dizer conferir-lhe importância. O que tem significado para mim é o que é importante para mim. Como nascemos sem nada, ou quase nada, passamos a buscar aquilo que nos parece importante; aquilo que nos falta. Sim. É a falta que nos põe em movimento. E essa falta varia justamente segundo a importância que damos às coisas. “A gente não quer só comida: a gente quer comida, diversão e arte”, diz a canção. Por isso, ser capaz de se importar é algo humano, demasiado humano.

Na banalização se torna difícil distinguirmos o que é essencial, isto é, o que realmente falta, do que é supérfluo. De minha parte, tendo a pensar que o essencial passa pelo básico, em sentido biológico mesmo: comer, beber, dormir, procriar (não necessariamente nesta sequência). E em época de banalização de tudo (a nossa), come-se de tudo, bebe-se de tudo, dorme-se menos e procria-se menos. Haverá um desequilíbrio?

A resposta, se é que ela existe, deve estar no saber o que importa. Diferenciar é dar importância, e isso só se pode fazer enquanto vivo, pois na morte não há importância: ela é a indiferença absoluta. Quando tudo: coisas, fatos, pessoas, relacionamentos, tendem a se banalizar, a perder a importância, a morte adentra à vida.

Importar-se com as coisas, com as pessoas, com o mundo é conseguir pequenas vitórias sobre a invencível morte. No muro que dá para ver da minha janela há uma pichação: “Bom dia, amor”.