Acordei hoje cedo com mensagens de felicitação pelo dia dos avós. Delas e das minhas amigas. Elas e eu sabemos o doce sabor dessa vivência. Não estamos sempre juntas. Umas cá, outra lá. Entre nós algumas escadas ou horas de avião. No entanto, há sempre um jeito de resolver essa questão para felicidade geral. Ou para os vazios que se interpõem oferecendo leito para a angústia e as incertezas desse tempo.
Uma voz aqui dentro me diz que não é esse o tom que se espera para esse dia. Desculpa. Não consigo encontrar outro para o dia em que o fascismo dá o primeiro sinal de instalação oficial. Minha geração, avós em sua maioria, sonhou para seus filhos e netos um futuro de paz. Ousou projetar a construção de uma nação que lhes oferecesse oportunidades independente do lar de origem. Acreditou no processo democrático como método de discussão e aperfeiçoamento do caminho. E, logicamente, com correção dos erros inevitáveis. Perdemos. Não conseguimos encurralar aqueles que teimam em frear o curso da história como se houvesse possibilidade de retorno ao paraíso, que entenderam ser seu por direito divino. Aos demais, que aguardem outra encarnação ou o reino dos céus.
Nesse dia que devia ser feliz, olho para elas e meu peito dói. Dói pela perda que 2016 impôs. Perda da chance de oferecer à sua geração um país com possibilidades reais de desenvolvimento sustentável, a partir da inclusão social. No vácuo desses três anos reverbera o que as palavras ainda não conseguem nomear. Não se trata apenas dos altos e baixos próprios da vida, mas da angústia de ver escorrer por entre os dedos algo que foi palpável um dia. De ver a progressão natural reverter o seu rumo, em uma luta que não se deu em campo aberto, mas nos mesmos porões em que facilmente apodrece a sustentação das frágeis democracias latino-americanas.
Tateando entre aperto e estarrecimento, meu coração tenta apaziguar o desencanto abraçando as minhas crianças. Conto-lhes histórias de um rio de forte correnteza que exige, além da união de muitos braços, novos impulsos para se tornar navegável. Elas buscam imagens com as ferramentas que dominam muito melhor que eu. Sugerem que a tecnologia e a transparência, que ela permite, são instrumentos poderosos desta travessia. No sorriso delas descubro que, em algum momento, se fará um clarão e a idade das trevas voltará ao ontem, de onde nunca deveria ter saído.