Não sei se é porque as coisas no país, de modo geral, andam tão ruins, mas eu dei para perceber a delicadeza sutil de alguns gestos. A generosidade de um novo colega de trabalho, o café compartilhado, o convite para dividir um almoço quando nem se sabe se há comida à mesa. Eu vejo flores em todo mundo. Menos no Bolsonaro, no Bolsonaro não.

Andei viajando pelo sertão do Piauí e comprovando aquela máxima de que o deserto faz brotar belezas. Estive com gente verdadeiramente acostumada com a dureza – ali, nada vem fácil: só se come o que se planta, o perto é longe, o tempo corre diferente, e não sou eu que vou chegar com o frenesi da vida na cidade grande, cheia de coisas pequenas, pra ditar um novo ritmo. O jeito foi sentar, botar os pés no rio, aceitar que às vezes a gente é mais parte do acontecimento do que mero espectador. E, no geral, é daí que surgem as melhores histórias.

Há um rio afogando em mim... secando... secando...

Há um rio afogando em mim… secando… secando…

E aí que num dia rude como ontem, uma mensagem despretensiosa – dessas que a gente grava no Whatsapp e depois fica ouvindo, perplexo com a diferença entre o modo como achamos que falamos e o nosso verdadeiro timbre – me trouxe um carinho na alma. Mais um nome que sai da minha lista de fontes e passa a ocupar o grupo de amigos, não por elogiar o meu trabalho. Sou vaidosa, gosto que as pessoas gostem de mim. Mas é mais que vaidade. É a simples coincidência em nosso modo de ver o mundo, a importância similar que damos mais ou menos as mesmas coisas e a leveza com a qual tentamos encarar a vida. E também o jeito fora dos padrões de cortar a pizza.

Meu coração está partido por um monte de motivos, mas o principal deles é, talvez, que eu queria entregar em mãos o violão que enviei pra Izabel, uma moça incrível que vive na margem do rio Uruçuí vermelho, uns 900 km longe de onde estou agora. Ela não enxerga e aprendeu a ouvir só o que vem de dentro. Eu imagino isso transformado em música e, de repente, penso que estou feliz.