Eu ainda me lembro quando a pessoa mais velha no rolê tinha perto de 20 anos. Passar da maior idade, para a maioria de nós, era sinônimo de muitas coisas como pegar o carro dos pais, pedir a própria breja no balcão sem julgamentos, ter finalmente barba no rosto e perder a cara de virgem como se a aparência mudasse magicamente com a simples virada de um número.

 

Entrar na segunda década de existência para mim era como acessar a terceira idade. Eu queria poucas coisas aos vinte e poucos anos, mas eu as queria muito. Sair de casa, trabalhar com algo divertido, ter algum tipo de liberdade e quem sabe algum dinheiro. Eu invejava coleção de discos, casas com ladrilho hidráulico, pessoas que tocavam gaita e gente que andava de salto com desenvoltura.

Tudo era sólido aos vinte e poucos. O apartamento alugado, a carteira de trabalho assinada, a rotina com horário de almoço, um amor abissal em banho brando. Eu odiava gatos, usava sapatilha, tomava suco pronto de caixinha e sabia que ia ter copa e ia ter golpe – porque eu sabia de muitas coisas e sempre com muita convicção.

Não existia nada fluido, nada, nada líquido além da champanhe que espumava no meu copo na virada de 2014 para 2015. Dali a cinco anos eu faria 30 mas isso era algo tão fora de minhas preocupações e mini certezas que nem me lembro de efetivamente projetar o que ou quem eu gostaria de ser, mas, desconfio agora que qualquer tentativa de fazê-lo jamais teria sequer esboçado o script do que sucedeu.

Passei esse 2020 todo (faltam 3 menstruações pro ano acabar) repetindo para mim mesma e também em forma de piada velha de twitter que não o incluiria na contagem dos meus anos nessa existência. Aparentemente o único consenso possível na atualidade é que o bug do milênio chegou aí com uns 20 anos de atraso e tudo bem, a gente até compreenderia, não fosse os danos causados parecerem propositalmente acumulados para despencarem todos, de uma vez, em nossas cabeças.

“Em dezembro vou trintar de novo”, repeti para mim em forma de deboche e convicção o ano inteiro. Que ironia pretender retardar o tempo quando tudo que a gente quer, no momento, é que isso tudo passe – não havendo outro jeito de passar se não perdendo esse pouco de vida e vendo o efeito do oxigênio e da gravidade agir sobre nosso corpo.

Aos 26 anos Caetano já tinha tretado com a censura e estava preso na cela de uma cadeia. Leopoldina aos 25 assinava o documento de independência brasileira, deixando para o marido o papel de dar um grito patético e virar meme quase dois séculos depois. Maria das Graças despontava com “Meu nome é Gal” aos 24, da Bahia para os palcos e Maisa (não a cantora, a do Silvio Santos), se assim quisesse, poderia ter se aposentado antes dos 15.

Eu, vou por aqui, fazendo conta de miçanga, desistindo hoje daquilo que comecei ontem, comprando os primeiros cremes anti-idade, doida pra usar o cabelo a la Debora Diniz e mais certa do que nunca de que toda, toda certeza mesmo, só serve para duvidar.