Por Samária Andrade

A resposta do título acima, aparentemente banal, é das coisas mais profundas. Entre tantas riquezas, ela aparece na peça “Aldeotas”, com Gero Camilo e Victor Mendes (texto do próprio Gero Camilo) , que encerrou a Semana Nacional do Teatro em Teresina na última segunda (27 de março).

Talvez porque o mundo seja grande (e limitada a nossa capacidade de interpretá-lo), passe quase despercebida a passagem de um ator da dimensão de Gero Camilo por Teresina com essa peça. Talvez porque o mundo seja grande (e os grandes meios de comunicação continuem importantes em dizê-lo: “isso faz parte, isso não faz”), muitos dos que foram, foram porque já viram o nome do ator na TV, onde quase sempre está em papeis diminutos. Talvez porque o mundo seja grande (e plural e potente e subversivo), tem gente muito boa produzindo insistentemente em todos os cantos do Brasil, mesmo que essa não seja a manchete, a casa cheia, o sucesso de público.

gero camilo

Foto: Karina Ades/Divulgação

Porque o mundo é grande, o pequeno Gero quase não cabe no teatro: encheu tudo com sua voz e seu corpo. Sem parafernálias, levou-nos à infância, ao açude, a dançar na tertúlia, a olhar a pequena cidade lá do aaaaalto do mirante, a sentir medo, a nos reconhecer e sorrir de nós mesmos. Rodeados de formigas, fomos até o centro do mundo.

Certamente porque o mundo é grande, imenso, não vai ser possível fazer jornalismo sem ir ao teatro. Sem ir ao cinema, ao espetáculo, à palestra, ao livro, ao forró, ao mercado, ao bairro mais distante do seu, à casa dos avós, ao açude, à tertúlia, à esquina. Porque, se a gente não se abrir para o mundo, vai continuar a andar só até o muro das nossas certezas. O mundo é grande. E não vai dar para entendê-lo com aquelas regrinhas que a gente decorou e repete e pensa que sabe. E pode ser que ninguém nunca lhe fale isso, e que você nunca perceba, e continue com suas regras, e classifique as pessoas, e já “saiba” das coisas antes de apurar a pauta, antes de tentar conhecer o outro. Como também pode ser que, mesmo diante do outro, você não o veja, você não tenha instrumentos para avaliar, não saiba onde colocá-lo, como dizê-lo, porque você não se permitiu, antes, encher-se das experiências da vida, porque, lembra, você já sabia, né? Aí você perde o mundo grande e o jornalismo perde e perdemos todos nós.

Se o jornalismo lhe exige uma técnica, exige ainda mais entender que o mundo é grande. Essa é a regra primeira. Vá se encher de vida, de gente, de cultura, antes de apurar, entrevistar, redigir – que este fica pequeno sem aquele.

“Onde você esteve?”, pergunta o garoto da peça a seu amigo. “Estive fora. Ou melhor, dentro”, responde o outro, mantendo segredo de que esteve no centro da terra. Precisamos estar fora, o mais longe que pudermos de nós, porque só saindo do nosso umbigo vamos poder encontrar lá dentro, quem sabe, alguém que possa reconhecer o outro. E cheio de você, sem o outro, pode até ser poesia, um bom texto, um desabafo, reclamação, opinião, mas não é jornalismo o que você faz. O mundo é grande.

PS: Por justiça a quem organizou e patrocinou a bonita Semana Nacional do Teatro, que trouxe espetáculos gratuitos que não chegariam até nossos palcos, seguem os créditos: o projeto teve o patrocínio do Sesi e apoio cultural  do Governo do Estado, por meio da Secretaria Estadual de Cultura – Secult e do Complexo Cultural Clube dos Diários\Theatro 4 de Setembro. Realização: Navilouca Produções e Eventos.