É preciso seguir em frente. É preciso seguir criando, realizando, questionando. Ninguém solta a mão de ninguém e isso quem faz cultura, arte, educação, produz conhecimento e pensamento crítico sabe muito bem há muito tempo e, por isso, muito bem. É preciso fechar para balanço e reabrir, já disse Torquato, e vamos não só nos reabrindo e rearranjando e nos reamarrando ao mastro para sobrevivermos à tempestade, mas nos reencontrando umas com as outras, uns com os outros e com nós mesmos.

Ninguém solta a mão de ninguém e a mão que estendemos até você em nossa capa é a mão de um rei. Um rei que deixou seu reino do outro lado do oceano e veio cometer o maravilhoso desatino de ser professor nessas plagas onde ninguém é mais plebeu do que quem ensina, ninguém é mais servo do que quem educa. Nosso rei de mão estendida é Francis Musa Boakari, que veio de Serra Leoa para o Brasil e não pronuncia a “palavra começada com ‘n’“ e, assim, nos ensina muito sobre muita coisa sobre ser livre e ser inteiro.

Ninguém solta a mão de ninguém e é assim no teatro nacional: todo mundo precisa de todo mundo para seguir, seguir em frente, enfrentamento e resistência, que  mostramos um pouco na reportagem dessa edição, com A vida sob atos. É preciso nesses tempos, e nunca foi tanto, deixar os corpos livres. E nossa repórter mostra, de Viena, na Áustria, como é passar um dia em uma praia FKK: corpos livres e nus em áreas públicas, sem classes sociais, só as marcas nos corpos contando histórias e vivências. É preciso seguir em frente e as editoras independentes abrem espaço Brasil afora, publicando livros e novos autores e poesia e resistindo, demarcando novos territórios para o conhecimento e a literatura. Também falamos sobre isso nessa edição #38. E também falamos outra vez de resistência e de independência apesar de tudo: falamos do cinema nosso, nosso do Piauí, de couro grosso e feito por gente que se dá as mãos para realizar, ninguém solta a mão de ninguém. Isso, tem cinema na Revestrés.

E tem mais: tem piauiense conquistando São Paulo pelo estômago, com a Fitó. Tem José Bezerra, o “rei dos cantadô”, que aos 89 anos segue fazendo rima e resistindo, que resistência é palavra que rende verso bom. E tem fotografia: o projeto Revelador H2O2, de Alex Oliveira, descolore e reinventa identidades em um jogo de visibilidades e invisibilidades que é inquietante e a cara do nosso momento atual.

É preciso não dar de comer aos urubus, é preciso sobreviver para verificar, disse nosso Torquato. E aqui estamos, seguindo em frente porque da gente urubu não vai se alimentar.
Esperamos que goste da Revestrés #38.

Por André Gonçalves

Editorial da Revestrés#38 – novembro-dezembro de 2018.