A maioria destas “acontecências” se passam a meio caminho entre Altamira e a capital do Pará, onde se estende a Transamazônica, com sua pista estreita, barrenta, pontes precárias que as chuvas desmontam, despenhadeiros.

Em Altamira, o velho Soares é proprietário de uma frota de caminhões de transporte. Homem feliz, bonachão, fiel à esposa, com quem tem três filhos: dois varões e Dalila, a primogênita e predileta do pai. Em um mundo de machos, foi Dalila que o velho Soares escolheu para acompanhá-lo nas longas e acidentadas viagens pela Transamazônica. Com o pai, ela aprendeu a dirigir e a caçar. Aos 17 anos, já pilotava os caminhões de carga e, armada de uma bereta, desafiava os motoristas da frota na caça para o almoço à beira da estrada. Botas de cano longo, enfiava-se no mato com o bando de homens e, para orgulho do velho, era quase sempre quem trazia as melhores caças.

Dalila tornou-se uma espécie de talismã da frota. Os motoristas acreditavam que os acidentes só ocorriam quando a moça não estava ao lado do velho Soares na liderança da frota. Superstição, talvez, mas o certo é que havia algo misterioso na figura ambígua de Dalila, que manejava uma arma com a mesma simplicidade com que embalava uma criança: bonita, corpo ágil e esbelto, maneiras delicadas, jeito doce mas extremamente decidido de olhar, um quê de profundezas de rio mesclado a uma energia de fogo. Em Dalila, o masculino e o feminino conviviam numa perfeita harmonia.

Mas o curioso é que, com ela, as coisas pareciam acontecer sem aviso prévio. Certa noite, sentiu-se mal subitamente no meio da estrada e, para espanto de todos, pariu um bebê. Naquele mundo de homens, ninguém percebera o estado da moça, até porque nem mesmo o pai jamais soubera de qualquer envolvimento da filha com algum homem. No momento do parto, vida e morte se aproximam, quando Dalila tem uma visão do amante sendo assassinado.

Alguns meses depois, ela confia o filho aos cuidados da mãe e volta ao trabalho. A ausência do talismã deixara a frota a mercê dos acidentes.

Naqueles poucos meses, o velho Soares perdeu dois caminhões, sendo que um deles rolou o despenhadeiro, inutilizando a carga e matando o motorista.

Novamente lado a lado na solidão da estrada, o velho Soares só então toma conhecimento da história de amor entre a filha e um homem que passou por

Altamira e alí foi assassinado, ninguém sabe porquê. Esta história folhetinesca, narrada por Dalila, deixa no ar uma indagação: realidade ou ficção? Sem dúvida, existe uma criança, fruto desse romance, mas foi assim mesmo que as coisas aconteceram? Ou Dalila quer esconder, com uma fantasia, os verdadeiros fatos?

Continua na próxima semana