Quando entrei na casa dos 50 anos, resolvi encarar o temível toque retal. Queria saber como andava a próstata, evitando qualquer surpresa desagradável. Afinal, longe de mim querer partir tão moço, sem ter amado ainda o suficiente. Confesso que a posição do exame não é das melhores, mas não chega a ser também o inferno pintado por aí. Tudo feito com profissionalismo e num piscar de olhos. Com a mão envolvida por uma luva e usando vaselina, o médico introduz o dedo no “forever” da gente, conforme gíria usada pela rapaziada. Estranho mesmo é o desconforto sentido depois, sobretudo, no dia seguinte, uma dor resultante de algo que entrou em lugar indevido e desconfortável. A compensação, por outro lado, chegou com a boa notícia de que a próstata estava no tamanho normal. Não era dessa vez, portanto, que a morte iria me envolver em suas ardilosas tramas.
O câncer de próstata, conforme dados oficiais, tem matado um número significativo e desnecessário de homens. Não só no Brasil como no restante do mundo. Um monte deles por simples desinformação, alheios aos cuidados que o sexo masculino deve ter com o desenrolar dos anos. Outros tantos, talvez a maioria, ainda presos a tabus machistas antiquados, do tipo de recusar qualquer procedimento ou exame que ponha em dúvida a sua masculinidade. Parte das campanhas educativas sobre o assunto, inclusive, reforçam tais preconceitos, a exemplo da que vi estampada na camiseta de um humilde senhor: “Sou homem com H. Não dou chance pro câncer de próstata”. Intrometendo-se assim, de maneira indevida, na opção sexual dos homens. Depois por não informar corretamente que todo homem, independente de sua opção sexual, deve se submeter a uma avaliação clínica anual a partir dos 50 anos.
Segundo dados do Ministério da Saúde, o câncer de próstata já é o terceiro tumor maligno mais diagnosticado no Brasil e o quinto que mais ceifa vidas. Ainda que esteja se sentindo bem e não tenha histórico familiar, o homem deve procurar um urologista a fim de realizar dois procedimentos essenciais e complementares – o exame de sangue e o toque retal. O primeiro aponta, através da dosagem do Antígeno Prostático Benigno (PSA), a existência de algum tipo de problema. Quanto ao segundo, embora constrangedor, confirma ou não a necessidade do médico agir sem demora. Descoberto precocemente, o câncer de próstata apresenta um grande potencial de cura por meio da radioterapia ou de cirurgia. Não esquecer que a maior incidência do tumor ocorre entre homens acima de 65 anos, notadamente negros.
Morrer é inevitável, queiramos ou não. Geralmente independe de nossa vontade. Entretanto, bobeira é o termo empregado para quem resolve se encantar de vez, vítima de sua própria ignorância ou de seus lamentáveis tabus. Quantos caras interessantes partiram antes da hora por receio de enfrentar uma inofensiva dedada. De cor, enumero alguns nomes bastante conhecidos e que deixaram saudade: Valdick Soriano, seresteiro-mor das cantigas de dor de cotovelo; Johnny Alf, precursor da bossa nova; Frank Zappa, guitarrista e compositor norte-americano; e, por fim, Telly Savalas, ator que encarnava o detetive “Kojak”. Lembro-me agora, nessa difícil escolha entre a vida e a morte, da sábia tirada filosófica de Quincas Borba, o mais instigante personagem da vasta galeria machadiana: “verdadeiramente há só uma desgraça: é não ter nascido”.