Hoje acordei cantarolando uma música da qual gosto muito, Por onde andará Stephen Fry, letra inspirada num ator inglês que, sem dar explicação ao elenco, deixou a peça em cartaz e, talvez querendo encontrar sentido na vida, ganhou o mundo, cuja história é de uma tristeza sem fim, daquelas de partir o coração: “Ninguém sabe do seu paradeiro/ Ninguém sabe para onde ele foi/ Pra onde ele vai”, pior é o alerta no final, dito sem dó nem piedade, ao pobre coitado – “Se correr o bicho pega, Stephen, se ficar o bicho come”, ainda bem que logo em seguida, antes do peito explodir em desalento, ou quem sabe por isso mesmo, surgiu outra canção lindíssima, Lenha, com versos pra lá de desconcertantes: “Eu não sei por que/ Eu teimo em dizer/ Que amo você/ Se eu não sei dizer/ O que quer dizer/ O que vou dizer”, dos que nos levam a bater cabeça sobre esse paradoxal sentimento, a ponto de tirar o sossego de todos nós, sobretudo, quando o poeta, sim, poeta, uma vez que somente um poeta, assunte bem, é capaz de tocar nossa alma, de forma tão indelével, ao falar que “Se eu digo ‘Pare’/ Você não repare/ No que possa parecer/ Se eu digo: ‘Siga’/ O que quer que eu diga/ Você não vai entender”, pra arrematar com belíssimas metáforas num refrão inesquecível e bastante sugestivo – “Mas se eu digo: ‘Venha’/ Você traz a lenha/ Pro meu fogo acender”, levando-me a perceber, finalmente, a razão de estar, em plena manhã de terça-feira, relembrando cantigas que marcam fundo, por variados motivos, durante esses últimos 20 anos, a fascinante e desafiadora travessia existencial – o show hoje de Zeca Baleiro, no Theatro 4 de Setembro, abrindo a temporada de espetáculos do projeto Seis e Meia 2017, esse talentosíssimo cantor maranhense por quem os brasileiros, em especial os filhos desta abençoada terra, têm o maior carinho e admiração, autor e intérprete de cantigas incorporadas ao imaginário coletivo dos amantes da boa música, a exemplo de Telegrama, Flor da pele, Disritmia, Mamãe Oxum, Era domingo, Bandeira, Quase nada, Salão de beleza,Bienal, entre tantos outros sucessos, iniciados no distante ano de 1997, com o disco Por onde andará Stephen Fly, embora meu favorito seja, disparado, Vou imbolá, lançado em 1999, que consolidou definitivamente, no plano nacional, a carreira musical de José Ribamar Coelho Santos, que responde pelo nome artístico de Zeca Baleiro, filho de São Luís, capital do Maranhão, que além de músico extraordinário, transitando em vários gêneros, destaca-se também pela veia literária, tanto em obras infantis quanto em livros de crônica de rara sensibilidade, sem falar de um puta ser humano que tive o prazer de conhecer em 2014, na Bienal do Livro de São Paulo, ocasião em que papeamos sobre cultura e algo mais – Revestrés, shows em Teresina, Salgado Maranhão, livros, Torquato Neto, teatro, Ferreira Gullar, ritos religiosos e Boy -, num imbolar maneiro sem data e hora para terminar, ainda mais que sabemos, Zeca Baleiro e eu, que “poesia não tem dono” e “Alegria não tem grife”, importando de fato é o show que ele, com abertura de Vavá Ribeiro, cantor piauiense dos mais talentosos, apresentará logo mais, às 18h30, com casa lotada, e ninguém doido de perder essa noitada que promete ser das melhores.
Wellington Soares
Coisas e outras