Estava tirando a sesta costumeira após o almoço quando, infelizmente, o celular tocou. Naquele dia, por esquecimento, havia deixado o aparelho ligado. Pior: no módulo normal. Embora chateado, ouvi com atenção as palavras da moça:

– Gostaria de falar com o senhor Wellington Soares.
– É ele.
– Senhor Wellington, meu nome é Gláucia e sou funcionária de uma empresa que presta serviço ao Banco do Brasil.
– Pois não!
– Como cliente do Banco do Brasil, gostaria de saber se o senhor não está interessado em fazer um título de capitalização no valor de 150 reais por mês.
– Estou ouvindo.
– E concorre a sorteio semanal no valor de 5 mil reais.
– Mas essa importância, querida, nem de longe resolve meus problemas financeiros.
– O prêmio mensal, senhor Wellington, é bem maior.
– Quanto?
– 15 mil reais.
– Sei não, ficar com o dinheiro empacado durante cinco anos…
– O melhor eu não havia dito ao senhor.
– Fale, minha jovem, pois preciso voltar ao meu sono.
– 3 milhões é o prêmio anual, soma nada desprezível, o senhor há de convir.
– Realmente você tem razão, uma bolada e tanto.
– Bom é que o senhor pode ganhar sozinho.
– Como assim?
– Sem a obrigação de dividir com ninguém, como acontece com os jogos da Loteria Federal.
– Essa grana toda faz até a gente despertar de vez.
– São 3 milhões, senhor Wellington, dinheiro que deixa qualquer um feliz.
– E o que faço com tanta grana?
– Ora, realiza todos os seus sonhos!
– Todos?
– Boa parte deles, pelo menos.
– Vamos combinar o seguinte, então, meu anjo abençoado…
– Quê?
– Volte a me ligar na próxima semana.
– Tanto tempo assim?
– No mesmo horário e no mesmo dia.
– Por que essa demora?
– Ganhar esse dinheirão todo é muita responsabilidade. Preciso decidir com calma, de preferência ouvindo a família.

Mal desliguei o telefone, levantei da rede e fui conversar com a esposa e as filhas, falar da possibilidade – quem sabe Deus não desse uma ajuda – em ficar rico, sair de nossa liseira crônica. Elas não só vibraram com a ideia, foram listando de imediato, numa alegria eufórica, os tão almejados objetos de consumo. Com mamãe e meus irmãos, a história não foi diferente. Quando dei conta, a notícia havia se espalhado pela vizinhança, bairro, amigos e parentes, inclusive, entre os mais distantes, que sequer me dirigiam um simples cumprimento. Parecia até que eu já tinha sido sorteado e estava com a fortuna nas mãos, só no ponto de dividir a bolada entre todos.

– E aí, senhor Wellington, vamos fazer desta vez?
– Sei não, Gláucia…
– Que homem indeciso é o senhor, senhor Wellington.
– Acontece que antes de ganhar essa riqueza, ela já foi gasta.
– O senhor está brincando comigo…
– Longe de mim essa atitude, minha cara.
– Que é então?
– Você não vai nem acreditar, mas é a pura verdade.
– Por não, senhor Wellington.
– Depois de contemplado, estou pensando em pegar um empréstimo.
– Pra quê?
– Honrar os pedidos que me foram apresentados.
– Aí também é demais, senhor Wellington.
– Mais grave ainda…
– Diga, estou ouvindo.
– A piriquete mais bonita e gostosa da cidade…
– Que que tem?
– Resolveu dar mole para mim.
– E o senhor não gostou?
– Sim, claro, mas custa uma fábula de dinheiro.
– Chorando de barriga cheia, desculpe a franqueza.
– E se a mulher descobre, aí mesmo é que estou fritinho da silva.
– Não entendi, senhor Wellington.
– Com a ajuda de um bom advogado, ela me deixa lixo.
– Mas, afinal, o senhor vai querer ou não garantir o seu futuro?
– Pensando bem, Gláucia…
– Não deixe escapar a sorte grande, homem de Deus.
– Prefiro continuar tendo sossego e meus 30 minutos de soneca.
– Boa tarde, senhor Wellington!