Vez por outra escuto alguém falar que não temos opções culturais em Teresina, sendo a pessoa obrigada, caso queira ver um espetáculo, a se deslocar para outra capital. De preferência, o Sul Maravilha – Rio e São Paulo -, ou, então, aqui mais próximo de nós, a Loira Desposada do Sol – Fortaleza. Como resposta, digo que estamos morando em cidades distintas, pois uma coisa que sobra aqui é fartura em termos artísticos, desde shows musicais estupendos até saraus poéticos da melhor qualidade. Sem falar ainda das belíssimas exposições e coreografias de dança. Essa mania em ignorar ou, pior, desqualificar o que produzimos, é que lasca tudo, mostrando o quanto somos carentes de autoestima, vítimas do “complexo de vira-lata”, esse sentimento de inferioridade, parafraseando Nelson Rodrigues, em que o piauiense se coloca, voluntariamente, em face do resto do Brasil.

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A título de ilustração, somente neste mês de maio assisti a quatro shows de tirar o fôlego da gente, a começar pela “Turnê Estratosférica”, da divina e maravilhosa Gal Costa, no Theresina Hall, em comemoração aos 50 anos de carreira da intérprete baiana. Com uma banda formada por músicos jovens, ela resolveu homenagear compositores de várias gerações – de Lupicínio Rodrigues (Vingança), Jorge Ben Jor (Os alquimistas), Luiz Melodia (Pérola Negra) a Antônio Cícero (Sem medo nem esperança) -, sem esquecer nosso Torquato Neto, ao cantar Três da madrugada. Outro artista nacional que veio a Teresina, desta vez pelo projeto Seis e Meia, foi o consagrado Agnaldo Timóteo, em show retrospectivo da longa carreira musical, entoando sucessos românticos que marcaram época: Meu grito, Ave-Maria, Mamãe, Os verdes campos de minha terra, A galeria do amor e Perdido na noite.

Entre os shows locais, a chamada prata da casa, dois mexeram profundamente comigo, despertando sentimento de leveza e regozijo, ambos ocorridos no Theatro 4 de Setembro. O primeiro foi “Paisagens Brasileiras”, apresentado pela Orquestra Sinfônica de Teresina, sob a batuta do maestro Aurélio Melo, e a cantora Soraya Castello Branco, em comovedora homenagem às Mães, concerto unindo música erudita e popular, contemplando grandes nomes da nossa MPB: Tom Jobim, Dominguinhos, Luiz Gonzaga, Toquinho, Assis Valente, Clôdo Ferreira e João Borges. Quem fez bonito lá também, em noite memorável, foi a talentosa Patrícia Mellodi, ao reunir um grupo de dez amigos, num show-festa, para cantar suas músicas e de outros artistas piauienses, acompanhada do Zerooitomeia Trio e por uma plateia de coro afinadíssimo, feliz da vida e com as canções na ponta da língua.

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Em termos literários, tivemos no começo do mês, dia 10, o Café Literário, sarau realizado mensalmente na livraria Anchieta, cuja edição homenageou duas novas poetas – Lina Ramos e Luiza Cantanhêde – que despontam no mundo das letras com um lirismo bem peculiar, tendo como fundo musical o som inquietante de Ricardo Totte. Na sexta-feira passada, com a Praça Pedro II lotada, tivemos a Roda de Poesia Tensão, Tesão & Criação, reunindo uma galera jovem de autores que desafinam, como diria nosso “Anjo torto”, o coro dos contentes. Nesta quinta-feira, 25, ocorreu o tradicional Sarau do Cineas, na Oficina da Palavra, com o lançamento de O terno e o frango, novo livro do intrépido Joca Oeiras, paulistano radicado em nossa primeira capital. E pra fechar, nada melhor que a circulação da 30ª edição da Revestrés, melhor revista cultural do Piauí, número dedicado ao cantor Rubens Lima, de saudosa memória, e que traz uma bela entrevista com a professora e jornalista Rosane Borges. Não tendo essa pauta toda, imagine você, caro leitor, se tivéssemos realmente eventos culturais em Teresina?