por Nathan Sousa
poeta, ficcionista, ensaísta e dramaturgo

Não é tarefa das mais difíceis encontrar quem conheça a obra do piauiense Orlando Geraldo Rêgo de Carvalho, que não cite, quase que de imediato, a palavra “loucura”. Dotado de grande sensibilidade e de grande poder de concisão, O. G. Rêgo de Carvalho nasceu na antiga capital do Piauí, Oeiras, aos 25 de janeiro de 1930, e faleceu em Teresina, no dia 9 de novembro de 2013. Bacharel em Direito, professor e funcionário aposentado do Banco do Brasil, O. G. integrou o chamado Grupo Meridiano. Publicou Ulisses Entre o Amor e a Morte (1953), Amarga Solidão (1956), Rio Subterrâneo (1967), Somos Todos Inocentes (1971) e Como e Por Que Me Fiz Escritor (1989). Foi membro da Academia Piauiense de Letras.

O autor de Ulisses Entre o Amor e a Morte tem sua obra marcada pelo conflito, pelo medo, pelas neuroses e, como se não bastasse, também retratou a solidão e a loucura. Leitor entusiasmado dos clássicos (decidiu ser escritor após ter lido O Guarani, de José de Alencar), O. G. elevou, como poucos, a arte literária ao status de agente revelador dos subterrâneos da vida real. Ambiente onde a historiografia tradicional não consegue atingir com muita segurança. São muitas as cenas de isolamento e conspiração da “loucura” de seus personagens. Há introspecção de fio a pavio. É nítida uma comunicação entre seus livros, embora sejam histórias independentes.

O que temos na obra deste genial escritor é uma forte ligação entre loucura, sentimentos e um passado que pesa dolorosamente sobre sua gente. Ou melhor, sobre nós.

Em todos os livros, O. G. expõe sua relação com o modus operandi de seu tempo. Há sempre uma descrição dos espaços arquitetônicos de Oeiras e Teresina, cidades onde morou. Ulisses guia e é guiado por suas percepções (impactado com as mudanças, após a morte do pai) da velha Oeiras para a terra de Saraiva. Aí já temos Joana, que ficou louca após a morte de seu filho, abandonada em um quarto esquecido, como era de costume. Há um êxodo muito claro nesta e nas demais narrativas. Mas não se trata apenas de um deslocamento físico de pessoas em busca de uma vida melhor. Há um êxodo imaginário, sentimental, esperançoso, ainda que permeado de medo e dúvida. Porém, a solidão e a desilusão deixadas na velha capital, acarretam em graves problemas tanto sociais quanto financeiros, e transformam a cidade em um ambiente propício para a loucura.

Em Somos Todos Inocentes, entra em cena o ressentimento, fruto de disputa pelo poder e de amor não correspondido. É tênue e anavalhada a linha que separa o passado do presente. Restou à antiga capital a preservação dos valores de fé e de tradição para que não houvesse um esfacelamento de sua identidade. Já em Rio Subterrâneo o sentimento fala mais alto, além de uma variedade de histórias que forma o tecido narrativo do livro. Trata-se da Teresina da segunda metade do século XX, mas é a Oeiras de onde partiram personagens e autor que dá o tom das memórias como se cada um desses agentes quisesse, a cada fracasso, reviver um tempo de glórias, ainda que mirradas. Mais uma vez, a dúvida, a desesperança e o silêncio interferem diretamente na personalidade de cada um.

O. G. era desses autores que mergulham suas vidas em suas obras de olhos fechados. É bom lembrar que ele adoeceu enquanto escrevia tal livro. O que temos na obra deste genial escritor é uma forte ligação entre loucura, sentimentos e um passado que pesa dolorosamente sobre sua gente. Ou melhor, sobre nós.

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Nathan Sousa é professor, ficcionista, ensaista, poeta, letrista e dramaturgo. É tecnólogo em Marketing e publicou vários livros, entre eles Um esboço de nudez (2014) e Semântica das aves (2017). Foi finalista do Prêmio Jabuti (2015) e venceu por cinco vezes os prêmios da União Brasileira de Escritores.

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