2017 quase 2018 e eu olhando pra três sementes de uva-verde ressequidas que completam agora o seu ciclo na minha carteira. Estou perplexa que talvez eu tenha conseguido realizar todos os três desejos proferidos mentalmente à meia noite, enquanto engasgava entre engolir a uva, abraçar os amigos e dar um gole de champanhe. Eu digo talvez porque só lembro com clareza de dois dos três desejos – o terceiro, por deus, se for o que eu tô pensando eu te perdoo, uva: era impossível mesmo.
O calendário começou a correr e eu fui estudar, fui ver o mar, fui pro sertão. Já vai fazer um ano e eu sigo na saudade de pegar a estrada, sem medo, sem pressa, sem ter porque ir e contente por ter pra onde voltar. Esse ano eu escrevi na mesma intensidade em que vivi, podemos ser francos, muita coisa esteve a volume máximo. Vi a Gal cantar Mal Secreto, fui ao cinema mais que o comum, terapia, trabalho, hambúrguer, yoga. Alguém se casou, um bebê nasceu, vi Mad Men, fui loira por um dia, só para lembrar que às vezes ousar é permanecer igual quando tudo é tão diferente. Viajei menos do que gostaria e mais do que eu poderia. Arranjei um novo emprego. Depois mais outro. E depois outro. Conheci pessoas tão legais que até neutralizaram algum encontro equivocado pelo meio do caminho.
Eu dei uma festa, mas depois disso eu fui a poucas, quase 0 festas – e me desculpe se você me convidou pra algum lugar que eu não fui, não foi pessoal. Pode-se dizer que eu virei alguém recatada e do lar, e não é por falta de esforço: eu cansei de me obrigar a ser alguém que se diverte, é uma disputa quase desleal entre meu quarto, meus livros e a pudim contra rolês estranhos (se formos deixar esse termo em 2017 eu invoco o movimento “não deixe o rolê morrer”) de músicas e rostos repetitivos. E você pode até argumentar que tenho ido a rolês errados, mas, ao que tudo indica, tenho escolhido os livros certos.
Esse ano eu não fiquei rica, mas prometo fortemente tentar no próximo. Pelo pouco que eu dormi e pela pose que eu banquei, era de se esperar um dezembro abastado – mas digamos que controle financeiro nunca foi exatamente o meu forte e eu encerro mais um ano fracassando na missão de interditar essa luana gastadora que habita em mim. Vocês vão ver, eu vou mudar. Em 2018 eu vou ser o tio Patinhas, me aguardem.
É engraçado porque eu puxo na memória e o flashback só me traz as viagens que eu não fiz, o inglês que eu não cursei, o artigo que não acabei. E isso diz tanto sobre mim que assusta. Há uma lógica totalmente burra em ser pessimista que é evitar sofrer adiante, nem que isso resulte em sofrer agora, durante e depois. Me vem na mente a certeza de que poucos sabem o duro que dei, a ideia de que entre acordar e dormir, eu só existi, eu só resisti, nem eu mesma sei dizer exatamente como eu consegui. Eu preciso o tempo inteiro do olhar do outro apontando e dizendo “ei, espera um pouco, parece que você deixou cair essas coisas boas aqui da sua sacola de existência”, e lá estou eu com o olhar pairando, séria e até um pouco triste, mas a verdade é que eu tô discretamente catando minhas conquistas espalhadas pelo chão.
Não precisa de reviravolta pra valer a pena. Nem revolução pra começar de novo. A mudança, ela acontece o tempo todo dentro de mim, todo dia, a todo minuto, silenciosa e quieta – desconfie das pessoas muito certas de quem são, elas provavelmente estão enganadas pela própria história que inventaram sobre si. Na contramão disso, esse ano todo, tudo que eu tentei foi me desinventar, me desconhecer, me tornar uma estranha a ponto de criar uma nova versão de mim, só pelo prazer de desfazer e levantar de novo, e de novo, e quem sabe, novamente. Erguida da dor, disposta a viver, mesmo que isso não signifique nada além de deixar ir e crescer. Manda o que tiver aí, 2018 – eu quero te conhecer.