Mais de um milhão de pessoas acompanham a criatividade e ousadia de oito jovens do interior do Maranhão, através do YouTube e Instagram, pelas performances com batidas de lata, coreografias inusitadas e muito piseiro – ritmo musical da região nordeste. Eles integram a banda Fundo de Quintal (OFC), formada em setembro de 2019 durante as brincadeiras nos quintais do povoado Centro dos Rodrigues, na cidade de Santo Antônio dos Lopes, a 300 km de São Luís. 

Bateria feita de lata amarrada com arames; chinelo, espiga de milho ou galho seco como microfone; barranco com areia e lama como locações. Esses são os instrumentos e o cenário das apresentações do OFC, gravadas com celular, semanalmente, por Riquelme Santos (14), vocalista; Victor Santos (18), percussão; Rhuan Miranda (17), percussão; João Vitor Paiva (16), cinegrafista; e os dançarinos Denilson de Araújo (18), Eulisses Nascimento (12), Jhaymerson Santos (18), Matusalém Santos (25). 

Bateria de lata, chinelo ou milho como microfone, barranco de areia como locação: Fundo de Quintal (OFC) | Foto: Theo Correia

Como boa parte dos virais da internet, a ideia a princípio era só fazer vídeos para brincar e divulgar entre os amigos. “De início, gravamos e postamos. No segundo vídeo achamos que faltava alguma coisa, chamamos o Eulisses (dançarino). E depois ele aqui (Riquelme, cantor)”, diz Jhaymerson. “E hoje é esse sucesso que você está vendo aí”, acrescenta Victor, satisfeito pelo grupo ser reconhecido por mais pessoas que a população da região de Santo Antônio dos Lopes, 14 mil habitantes segundo o IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística). 

A tarde de brincadeira de vizinhos com uma caixa de som e microfone hoje rende vídeos no canal do YouTube, com mais de um milhão de inscritos, viagem a São Paulo para conhecer produtoras e gravar clipes em parcerias com outros artistas. “Quem diria o cara gravando assim na lama, aquela poeira toda, levar a gente para São Paulo, é muito gratificante, ‘tédoido’”, diz Jhaymerson admirado pelo feito, ao lado dos outros garotos, sentados na porta de casa, em conversa com a Revestrés pelo Zoom. 

Mais de um milhão de seguidores, vindos de uma região de 14 mil habitantes, no interior do Maranhão; bateria de lata, milho como microfone e compartilhados por “celebridades”

Nos vídeos do OFC, a cada nova música a dramatização conta com voadoras (golpe de perna com chute no pescoço), chutes e cambalhotas pelo chão. A proposta dos integrantes leva humor e criatividade sem limites. “É porque o vídeo em que saiu uma voadora a galera gostou. Agora a gente coloca sempre algo e a galera gosta”, ri Jhaymerson. Roteiro, seleções de música e figurino são planejados pelo baterista Victor Santos. “Eu penso no que pode ter, mas levo em consideração a ideia e criatividade de todos os meninos”, diz o baterista, que já deixa claro que os chutes e voadoras não são nada ensaiados, mas que ninguém sai machucado porque são “profissionais”. 

A fama nas redes sociais trouxe para os meninos visibilidade entre artistas nacionais, como Anitta e Dennis DJ. O OFC também tem a atenção do cineasta Kléber Mendonça e do jornalista Xico Sá, que compartilham suas apresentações no Twitter com elogios. Nos vídeos, os hits mais escutados no Brasil já foram gravados pelo grupo. Além das famosas músicas brasileiras, o grupo faz covers de artistas internacionais com as “versões fq” (como chamam as versões da própria banda). 

As músicas de Miley Cyrus, Guns N’Roses e Justin Bieber foram algumas delas. A canção Sweet Child O’ Mine, da banda de rock norte-americana, foi parodiada como “topada grande”, onde relatam a surra que levam da mãe ao quebrar uma chinela. A música Baby, do cantor canadense, ganhou versão “chá de boldo”, em referência ao remédio para, segundo eles, “curar o Coronavírus”. 

O sucesso de visualizações e número de seguidores, que crescem diariamente nas redes sociais, fogem do que eles imaginaram quando lançaram os primeiros vídeos na internet com covers de músicas de forró. “A gente tem uma noção de onde nossos vídeos chegam, mas também sabemos que vai muito mais além”, diz Victor. Eles contam que tiveram o trabalho conhecido por uma youtuber internacional e uma das maiores páginas de memes “da gringa”. Para eles, que estão fora do eixo de visibilidade midiática brasileira, não era algo esperado em menos de um ano de divulgação na internet. “A gente fica feliz, mas tenta encarar da maneira mais natural possível para não subir à cabeça. Sempre humildes e com pé no chão e fazendo sempre o que sabemos: humor, música e alegria”, comenta Jhaymerson, sobre ter o reconhecimento de artistas e do público. 

Entre os projetos já idealizados pelo grupo foi realizado o CD Respeite o Desmantelo, com 10 faixas, disponível no site Sua Música e YouTube. O material, que a princípio teria um financiador, teve que ser bancado pelos integrantes para ser lançado. “Suamos as canelas para pagar, mas tá aí. Mais de 500 mil ‘visu’ no YouTube”, fala Jhaymerson, sendo complementado com mais números pelos outros. Em São Paulo, gravaram quatro clipes e fizeram uma entrevista exclusiva com o Kondzilla, maior canal do YouTube no Brasil. Durante a produção dessa matéria, receberam a placa de um milhão de inscritos no Youtube e postaram nos stories do Instagram: “Só via os outros ganhando, hoje é nós”, disse Denilson emocionado, enquanto limpava a placa. 

Uma das inspirações dos garotos é o piauiense Whindersson Nunes, um dos maiores youtubers brasileiros. Também são fãs do trabalho do Tirulipa, humorista cearense, e da banda de rock cômico Mamonas Assassinas, sucesso no país na década de 1990 pelas apresentações criativas e engraçadas. O grupo relata que os dois humoristas estão bem próximos da realidade em que vivem, por serem conhecedores da vida no interior. Recordam que em um mesmo dia Tirulipa notou o trabalho do grupo e eles atingiram um milhão de seguidores no Instagram. O OFC comemorou soltando foguetes no povoado. “ A gente surtou, foi uma felicidade muito grande. Foi foguete demais”, conta Victor, satisfeito. 

Shows, lives e empresário já fazem parte da rotina da banda que nasceu no interior do Maranhão e conquistou o Brasil. Mas são enfáticos em dizer que se o dinheiro aparecer é lucro. “ Nós queremos é fazer um trabalho bem feito com vídeos engraçados, para contribuir com a alegria dos fãs e mostrar a brincadeira raiz de interior”, finaliza Jhaymerson, seguido da confirmação de todos. 

Publicado na Revestrés#47 – Dezembro 2020-Janeiro de 2021.

Pra curtir um clipe OFC, procure no Youtube: Fundo de Quintal OFC

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