Mudanças no nome são capazes de indicar novos sentidos ao destino. Essa percepção se sustenta no caso do menino Carlos, nascido em Teresina no dia 14 de janeiro de 1931. O nome escolhido pela família durou 11 anos antes da primeira mudança (na verdade, descoberta). Carlos Salomão Abraão Abud Said é, na verdade, Carlos Said, que descobriu o verdadeiro registro ao realizar o exame de admissão do ensino primário e verificar a certidão de nascimento pela primeira vez. O nome fora encurtado pelo tabelião contrariando a tradição da família de origem árabe. No entanto, isso não diminuiu a intensidade vivida nos anos seguintes por aquele que viria a tornar-se um mito forjado na teimosia, persistência e paixão. 

 O homem que acorda cedo, apara a barba diariamente e mantém sua rotina de trabalho há mais de 70 anos, coleciona títulos profissionais. Jornalista, professor (lecionou História e Geografia em escolas e no curso de História da Universidade Federal do Piauí), goleiro, servidor público federal, cronista esportivo, bacharel em Direito, escritor e outros tantos personagens da carreira deste único homem (ou homem único): Carlos Said é figura das mais simbólicas e peça viva da história de Teresina e do Piauí.  

O filho de Salomão Abraão Said e Fadua Abud Said, casal que deixou a Síria antes da Primeira Guerra Mundial (em 1914), descobriu cedo o encanto de sua vida: o futebol. “Foi quando começou a Copa do Mundo da França. A imprensa alardeou que os melhores jogadores do Brasil iriam jogar e eu decidi torcer para o país ganhar. Infelizmente não deu certo. Mas muitos dos bons jogadores anunciados pertenciam ao Flamengo carioca, então eu pensei ‘ah, esse é o time!’ e passei a torcer pelo Flamengo”, revela. 

 A rigidez da educação dada pelo pai foi um dos primeiros desafios enfrentados por Carlos Said em nome da paixão pela bola. Ele conta que fugia de casa desde os sete anos para jogar futebol, contrariando a expectativa da família de habilitar o filho para as atividades no comércio e os estudos. “Eu apanhei muito do meu pai. Às vezes nem comia, mas nunca desisti. O futebol era considerado coisa de moleque, mas eu já gostava muito e queria jogar. Mesmo assim eu também nunca deixei de estudar”, pondera ao contar das primeiras experiências escrevendo sobre esportes no Ginásio Leão XIII. O ambiente que lhe proporcionou desenvolver habilidades não foi suficiente e seus sonhos eram maiores que os murais da escola. 

 “Em 1943, eu fui até a redação do Jornal do Piauí e pedi para me deixarem escrever algumas linhas sobre futebol. Das pequenas notas eu fui aumentando meu espaço. Era difícil, pois naquele tempo só se escrevia sobre literatura ou política, já que futebol era pra moleque. A minha teimosia foi tão grande que eu venci”. Assim, Carlos Said inaugura sua presença no jornalismo esportivo passando por outros veículos impressos como Folha da Manhã, Jornal O Dia e O Estado. Recentemente assinava uma coluna no Jornal Meio Norte. Sempre com seu porte físico franzino e a obstinação peculiar, Carlos Said também ocupou espaço nas rádios amplificadoras entre meados de 1940 até início dos anos de 1950. Estas eram situadas em postes de iluminação das principais praças do centro de Teresina, como Pedro II e Rio Branco.  

Ele levou o pioneirismo em diversos eventos, tal como em sua inserção nas transmissões através da Rádio Difusora de Teresina AM.  Sem medo da novidade, Carlos conta: “fui pedir para fazer um programa que só era de cinco minutos. Mas veja só, o programa começava e mal eu entrava para falar de futebol e já estava terminando”, explica, sorrindo da lembrança. 

Matéria completa na Revestrés#40-março-abril de 2019.