Atenção, senhoras e senhores! Com vocês, o acrobata Arnaldo da Costa e Silva! Apesar de não ter nenhum parentesco com o escritor, risca seus movimentos com poesia. Quem o vê logo reconhece o porte atlético, apesar da altura: 1,64 cm. No currículo, acumula temporadas por grandes circos da Dinamarca, Holanda, Alemanha, França, Espanha e Portugal.

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(Foto: Mauricio Pokemon)

Aposentado aos 34 anos e há poucas semanas de volta a Teresina, sua terra natal, conta como foi a despedida do trapézio. “Ah, o último show lá foi um pouco dramático”, diz divertindo-se ao se referir à sua última temporada no Zirkus Charles Knie, na Alemanha. Após quase 15 anos na Europa, chegou o momento de dizer adeus à cama elástica. “A vida do acrobata é muito curta e eu preferi acabar quando estava em plena forma”, relata.

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(Foto: Mauricio Pokemon)

Temporariamente de volta à casa de sua mãe, professora aposentada, tudo ainda é uma possibilidade. É de se esperar que quem passou a vida sobre rodas não fixe raízes assim. “Quem sabe abrir uma escola de circo aqui, quem sabe voltar para o Rio de Janeiro, tudo é uma possibilidade…”.

Na infância, Arnaldo foi levado ao circo pelo pai, um delegado de polícia apaixonado pelo picadeiro. Seu Antônio João Neto faleceu há 12 anos, mas despertou no filho o que viria a se tornar um sonho – e realizado. Ainda criança, Arnaldo assistiu a um campeonato de ginástica olímpica na TV. Adolescente, viu os capoeiristas realizando saltos mortais e acrobacias.

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(Foto: Mauricio Pokemon)

Ficou fascinado: “Eu disse: é isso que eu quero fazer”. Até conhecer os gêmeos Faísca e Fumaça. Os irmãos palhaços mediaram seu contato com Renato Ferreira, um dos fundadores da Up Leon, companhia de circo carioca que atua há mais de 20 anos na Europa. “Eles, de fato, colocaram aquela semente do circo na minha cabeça”.

Aos 17 anos, trabalhando como amador em pequenos circos, Arnaldo tinha três escolhas: servir ao Exército, ser funcionário de uma grande empresa local ou ir embora para o Rio de Janeiro. “Sei lá como era o Rio de Janeiro, mas fui”. Matriculou-se na Escola Nacional de Circo, onde fez a formação de quatro anos e se especializou no trapézio, uma das técnicas de acrobacia aérea. Mas a escola lhe rendeu mais que uma formação. Arnaldo conquistou a carioca Isabel Costa, colega de curso e também trapezista, que viria a se tornar esposa e integrante da trupe formada em 2007: The Flying Costa.

Os quatro anos de curso tiveram direito a todas as dificuldades que um jovem estudante passa ao sair de casa: acordar cedo, trabalhar, estudar e dar aulas para incrementar a renda. Morou em trailer no circo e, nas noites de espetáculo, Arnaldo se revezava com outras poucas pessoas para limpar o espaço, preparar luz e som, apurar os ingressos na bilheteria, apresentar seu número, baixar a lona e estar pronto para o dia seguinte. “Isso me deu um entendimento da logística porque, até então, eu achava que tudo era mágica”.

Trabalhou no Circo Marcos Frota, no Parque Beto Carreiro, participou de festivais no Paraná e Minas Gerais e teve professores como o francês Hubert Barthod, campeão mundial de cama elástica em 1986. Até que começaram a surgir convites para o exterior. Aos 20 anos, com diploma debaixo do braço, Arnaldo deu mais um salto em direção à sua meta. Ao lado de Isabel, os dois aceitaram o convite do Circo Chen, em Lisboa, Portugal, primeira parada de outros destinos que viriam em seguida.

E sonho? Tem, sim senhor! 

Uma vez com os pés na Europa, as rápidas voltas ao Brasil se resumiam a renovação dos vistos internacionais. Até que, em uma dessas vezes, nasce o filho Ângelo, hoje com 11 anos.

Com os demais países a serem conquistados, Arnaldo e Isabel não se contentaram apenas com Portugal. Após uma breve temporada de 40 dias em Lisboa e alternando com outros trabalhos no Brasil, logo o casal foi convidado para trabalhar na Espanha. “Ficamos quatro anos. Era muito cômodo e confortável, mas queríamos mais”. Em 2004 o casal parte rumo ao Cirkus Dannebrog, na Dinamarca e, daí, não param mais: Festival Internacional de Circo de Enschede, na Holanda; Cirque Pinder, na França e Circo Barum, na Alemanha.

Para participar dessa rotina é necessário muito preparo. Os grandes circos europeus viajam, em média, uma cidade por dia. É preciso providenciar água para todos os traileres, iluminação para a lona e ruelas da vila circense e garantir a desmontagem da estrutura toda em cerca de uma hora e meia. Acontece um show à parte: aproximadamente 100 pessoas trabalham na produção, montagem e desmontagem e apresentação dos números.

A essa altura, preocupados em se profissionalizar cada vez mais, compraram seu próprio material de trabalho, um trailer e mergulharam em meio às diversas apresentações e premiações em festivais competitivos de circo. “Nessa época, nosso filho tinha dois anos. A gente o colocava no fundo do circo e pedia para alguém olhar. A gente fazia nossa apresentação e voltava”, diz Arnaldo olhando para Ângelo, que acompanha nossa entrevista.

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(Foto: Mauricio Pokemon)

 

Desde bebê o garoto viveu a rotina do circo. Apesar de falar português, foi alfabetizado em alemão e, hoje, tenta se adaptar ao clima do Brasil. Pergunto se quer seguir a carreira dos pais, ao que ele me responde com firmeza: “eu quero ser engenheiro”.

Por duas vezes Arnaldo recebeu convites para integrar o Cirque du Soleil, na época com nove espetáculos que circulavam o mundo. O primeiro convite surgiu para um show em Tóquio, no Japão, em 2008. No entanto, foi endereçado somente ao acrobata. O segundo apareceu para um espetáculo em Macau, na China, para toda a trupe, em 2010.

Sua empresa, The Flying Costa, formada por quatro colegas de diversas nacionalidades, já existia desde 2007 e resolveram não abandonar o nome próprio para serem personagens de um show. “Depois de tanto esforço o nome da nossa trupe iria desaparecer”, explica Arnaldo sobre os motivos da recusa do convite.

A aventura rendeu o que os circos prometem: magia. Entre servir ao Exército, ser funcionário do comércio e circense, Arnaldo não deixa brecha. “Eu não tenho dúvidas de que fiz a escolha certa. Eu realizei um sonho”.

 

(Publicado na edição #23, dezembro/janeiro de 2016)