Projeto. Esta é a palavra chave para quem pretende tornar um sonho realidade. Nas artes, levar à frente seus antigos planos vai muito além do desejo. É preciso elaborar com calma o que será feito, escolher qual o melhor caminho a percorrer e, quem sabe, contar com uma ajuda extra de colaboradores e pessoas que acreditam em você e em sua capacidade de criar. Para isso é que existem as leis de incentivo que tem ajudado muitos artistas a lançar CD’s, livros, realizar shows e desenvolver atividades diversas. Para alguns, pode ser fácil percorrer esse caminho. Para outros, no entanto, é possível que acabe em frustração. Revestrés resolveu conversar com quem entende do assunto e traz um mapa dos principais editais e dicas sobre o que fazer para garantir a aprovação do seu projeto.

Música, teatro, dança, artes plásticas, artes cênicas, literatura. São muitas as opções para quem quer se inscrever em algum edital. No Piauí, o Sistema Estadual de Cultura (SIEC) surge como uma das primeiras opções. O SIEC já teve seus momentos de descrédito e hoje busca a recuperação de sua credibilidade abalada por alguns projetos que não conseguiram sair do papel por falta de dinheiro.

A lei n. 4.997, de 1997, que criou o SIEC, já vinha sendo motivo de debate, em razão da necessidade de mudança. Depois de vários encontros da classe artística, ela  passa agora por alterações que foram aprovadas na Assembleia Legislativa.  Entre as mudanças o artista passa a ser visto como empreendedor, podendo enquanto pessoa física concorrer com até dois projetos ao mesmo tempo, e pessoa jurídica com quatro. A lei que modifica o SIEC foi sancionada pelo governador do Estado, Wilson Martins, em fevereiro deste ano.

Bid Lima, presidente da Fundação Cultural do Estado acredita que, com as mudanças, aumentam as chances de muitos artistas de conseguirem ver um projeto aprovado. No entanto, ela lembra que a classe ainda perde pela desinformação. Há quem não saiba como o SIEC funciona e muito menos como concorrer. “Reconheço que falta uma maior divulgação da lei, esclarecimento. Esse é um dos pontos a ser trabalhado nesta nova fase”.

Na iniciativa privada as dificuldades também existem. O Banco do Nordeste que todos os anos investe em editais na área cultural, vê artistas deixarem passar boas oportunidades. Nesta seleção, o caminho é bem mais árduo. As exigências são muitas e é preciso estar atento a apresentação do projeto.

Todos que concorrem sabem o que querem, mas transcrever, de forma clara e objetiva suas pretensões, justificativas, objetivos, é complicado

Segundo Alexandre Castelo Branco, assistente de superintendência no Piauí e responsável pelo edital do banco no estado, um dos erros mais comuns na hora de apresentar o projeto é a falta de documentação. No Piauí poucos são aprovados. “São muito amadores, a gente percebe que não há qualidade. Já pensamos em fazer uma parceria com a UFPI ou a Fundac para realizar oficinas que ensinem o artista a elaborar seus projetos”, diz.

A seleção é dividida em etapas: inscrição, habilitação e contratação. No primeiro estágio já há uma grande eliminação de projetos. Alexandre conta que em razão da baixa participação local, tem se buscado através de esforços conjuntos mudar essa realidade. “Já conseguimos melhorar e superar a primeira e segunda etapas, mas na terceira ainda há muita perda. Nosso Estado tem pecado em relação a qualidade dos projetos e não é inerente ao banco, não temos técnicos para ensinar como fazer o projeto, mas estamos pensando como mudar isto”.

Botando no papel

Passar pela peneira que é ter um projeto aprovado através das leis de incentivo é meio caminho andado para colocá-lo em prática.

Um dos aprovados no último edital da lei de incentivo cultural A. Tito Filho,  da Prefeitura de Teresina, é o CD de reggae da banda Regaplanta Roots!  Intitulado “Natureza Interior”. Trata-se de uma produção fonográfica profissional, o primeiro registro oficial dos músicos. O projeto do CD será 100% financiado pela Lei A. Tito Filho, mas a banda vai precisar de outros parceiros para seguir em turnê.  A ideia é poder percorrer o maior número de cidades do Piauí e depois todo o Nordeste.

Como todo projeto, ele foi bem pensando, na intenção de explorar outros mercados musicais. “Iniciamos os trabalhos de arranjos e composição no final de 2012, após a aprovação do projeto. Creio que até o final de julho, se tudo ocorrer como planejado, estará pronto para executá-lo plenamente”, diz o músico Leandro Sales.

A lei A. Tito Filho, lançada por meio da Fundação Monsenhor Chaves, trouxe algumas novidades no edital de 2012. O valor do Fundo Municipal de Cultura para os projetos, que antes era R$ 500 mil, dobrou para R$ 1 milhão. 94 projetos nas áreas de literatura, música, patrimônio, teatro, artes visuais, dança e vídeo/fotografia foram recebidos pela FCMC.

Pela primeira vez participando de um edital, Leandro conta que foi preciso se informar bem para não cometer erros na hora de elaborar o projeto. E dá a dica. “Procurem pessoas que tenham participado dessas seleções e que lograram êxito com seus projetos. Na maioria das vezes, o problema está no projeto em si, na construção e elaboração, no aspecto formal da coisa. O conteúdo material desses projetos é excelente, vi muitos que não foram aprovados que possuíam um conteúdo riquíssimo”, lembra o artista que sabe da importância de estar por dentro do edital para não se frustrar no futuro. “Li e reli o edital pelo menos umas cinco vezes (ler o edital é muito importante) e comecei a planejar o que eu ia fazer. A principal dificuldade, e acredito que de muitos também, foi colocar no papel o que realmente eu queria. Todos que concorrem sabem o que querem, mas transcrever, de forma clara e objetiva suas pretensões, justificativas, objetivos, é complicado. Pelo menos essa foi minha dificuldade”.

Aurélio Melo, regente da Orquestra Sinfônica de Teresina(OST), conseguiu no ano de 2012 percorrer o país com os músicos piauienses levando o projeto ‘Concertos para o Sertão’, que chegou a ser aprovado pela Lei Rouanet e contou com o apoio da Petrobras. Para 2013, mais um projeto foi aprovado. “Estamos esperando a captação de recursos. Possivelmente também será a Petrobras”. Ele reconhece que é preciso buscar o apoio dos editais para realizar projetos locais e cabe ao artista ousar na criação. Ter um fundo social e uma grande abrangência cultural são alguns dos critérios que podem garantir uma boa avaliação e, quem sabe, a aprovação.

Dando uma mãozinha

Para quem não sabe elaborar um projeto, procurar empresas e pessoas que entendam do assunto ajuda na hora de concorrer nos mais diversos editais que são publicados a cada ano. Gil BV, do Movimento Hip Hop, faz parte de uma empresa que trabalha na elaboração de projetos culturais. “Por exemplo, pela lei A. Tito Filho, nós iremos catalogar interessados nas diversas áreas culturais das quais o edital oferece. Primeiramente trabalhamos na base de cada artista fazendo o texto, a apresentação, e desenvolvendo o histórico de atividades recentes”, diz.

Em abril, ele adianta que será aberto o Escritório de Apoio a Produção Cultural do Piauí (EAPCult) que pretende potencializar os projetos já existentes, bem como, segundo Gil, formatar novas ideias a partir das demandas. O espaço vai funcionar no vagão Mandu Ladino, na Av. Marechal Castelo Branco. O artista acredita que o escritório deve preencher uma lacuna que existe em Teresina, orientando os interessados em concorrer aos editais. “Na verdade o que é difícil não é a elaboração e sim a concepção, pois a ideia de se fazer um projeto é simples, só que na hora de colocar no papel muitas pessoas encontram dificuldades”.

Na opinião de BV, na maioria das vezes é complicado conciliar a atividade artística com a atividade burocrática, mas cabe a cada um usar das ferramentas disponíveis para dar visibilidade as suas ideias. “Nos tempos atuais, o artista tem que praticar o ‘sivirismo’, se virar para elaborar um projeto. Hoje, com a internet, os editais vão ficando cada vez mais concorrido e mais sofisticado com preenchimento online. Isso veio pra facilitar, mais pra quem ainda não domina a linguagem fica mais complicado. Só que a maior dificuldade, na minha opinião, é a  falta de capacitação dos artistas”.

Nos tempos atuais, o artista tem que praticar o “sivirismo”, se virar para elaborar um projeto. Hoje, com a internet, os editais vão ficando cada vez mais concorridos e mais sofisticados

O trabalho da equipe do escritório não deve se limitar somente aos editais locais, mas também aos nacionais, onde, na maioria das vezes, faltam projetos piauienses. “Nos editais da Petrobras, Caixa, Ministério da Cultura, enquanto estados como Ceará e Pernambuco, qualificam trezentas, quinhentas propostas por edital, nós aqui do Piauí encaminhamos de trinta a cinquenta, e essa quantidade, às vezes, influencia na hora da aprovação”, revela.

Para quem está começando, ele deixa a dica. “Estudar bem o edital, buscar fazer um bom currículo, histórico do proponente. Daí é focar no objetivo e na ideia principal que estará concorrendo. Lembre que quem vai lê e avaliar seu projeto são pessoas da área na qual você concorre, sempre são bem minuciosas e observando os mínimos detalhes da proposta. Por isso  é importante está bem claro e firme nos argumentos”.

Acerte no alvo
Já tem um projeto? Conheça algumas das principais leis e editais de cultura espalhados pelo país e saiba como se inscrever!

– O Sistema Estadual de Cultura (SIEC) possui duas modalidades, Mecenato e Fundo. Para participar através do Fundo é necessário que seja lançado um edital. Já através do Mecenato, o interessado apresenta um projeto à Fundac. O modelo está disponível no site da instituição(www.fundac.pi.gov.br). Os interessados devem enviá-lo para cultura@fundac.pi.gov.br.  O projeto será cuidadosamente avaliado pelo conselho deliberativo do SIEC, formado por dez componentes entre pessoas da classe artística, indicados pelo SATED, mais o presidente da Fundac e representantes das secretarias de Fazenda e Planejamento, Associação Comercial, Conselho Estadual de Cultura e Assembleia Legislativa.

– A Lei Rouanet, criada em 1991, foi o instrumento encontrado pelo Governo Federal para ampliar os investimentos na área cultural do país. O artista apresenta uma proposta ao MinC, para aprovação. A aprovação do projeto não significa que o mesmo será patrocinado. É apenas a autorização para o artista captar recursos junto a empresas que, posteriormente, tem o valor investido abatido em impostos. O prazo para a obtenção de recursos é de um ano, podendo ser renovado por mais seis meses. As propostas devem ser apresentadas de 01 de fevereiro a 01 de novembro de cada ano. Todas as informações de como concorrer estão no site do Ministério da Cultura: www.cultura.gov.br.

– A  Lei A. Tito Filho (Lei nº 2.194), lei municipal de incentivo à cultura, foi criada em 1993 e já possibilitou o financiamento de quase 200 projetos em diversas áreas. O incentivo fiscal às empresas dá-se com o ressarcimento total, pela Prefeitura de Teresina, através de desconto de ISS e IPTU (ou seja, 100% do valor investido no limite de 20% do imposto devido). Todas as informações sobre como funciona o edital são disponibilizadas no site da FCMC (www.fcmc.pi.gov.br). As inscrições são gratuitas e podem ser feitas na sede da Fundação, na rua Félix Pacheco, 1430, Centro, sempre que aberto o edital. Os projetos são analisados por especialistas escolhidos pela FMC, formada por pessoas com competência nas diferentes áreas abrangidas pelo edital.

– Banco do Nordeste: O Programa de Cultura Banco do Nordeste/BNDES realiza oficinas para a elaboração dos editais. No Piauí, elas acontecem em Teresina, Parnaíba e nos dois municípios do estado que possuem centros culturais da instituição, que são Pedro II e Guaribas.    O programa patrocina com recursos dos bancos, projetos inscritos nas áreas de música, literatura, artes cênicas, dança, artes visuais, audiovisual, patrimônio e artes integradas. São contemplados mais de 300 projetos, todos os anos, com o montante de R$ 8.000.000,00 (oito milhões de reais).

– Petrobras: Além de patrocinar projetos culturais aprovados nas leis federais de incentivo à cultura, a Petrobras possui ainda o Programa Petrobras Cultural, que destina milhões todos os anos para projetos de todas as regiões do país através de seleção pública. São 11 áreas contempladas e a inscrição é gratuita, feita exclusivamente pela internet. (ppc.petrobras.com.br) O interessado deve preencher o formulário disponível no site durante o período de inscrição. O processo de seleção acontece em 4 etapas que também pode ser acompanhadas pelo site.

(Matéria publicada na Revestrés#07 – Março/Abril 2013)