Ele é um dos nomes comentados no jornalismo político online brasileiro. Renato Rovai é criador e diretor da Revista Fórum e escreve o Blog do Rovai. Com linha progressista e crítica, a Fórum foi o primeiro veículo de comunicação processado por Jair Bolsonaro em seu mandato na Presidência da República. O motivo foi a publicação de uma conversa de Bolsonaro com o filho, Eduardo Bolsonaro (PSL/SP), em que o pai diz que não vai visitar o filho na Papuda, complexo penitenciário do Distrito Federal (O fotógrafo Lula Marques, que fotografou a conversa de celular de Eduardo Bolsonaro, também responde a processo).

Foto: Maurício Pokemon

Rovai está lançando o livro Como Derrotar o Fascismo: em eleições e sempre (Veneta/Hedra), escrito em parceria com Sergio Amadeu, sociólogo, doutor em Ciência Política, professor da UFABC e pesquisador em cibercultura.

O livro analisa a ascensão de uma nova direita ― mais agressiva, adaptada ao mundo digital e que usa táticas de desinformação, impulsionadas por emoções amplificadas pelas redes sociais. Os autores admitem o sucesso desse modelo no Brasil e no mundo atual, mas defendem que o fascismo é uma doutrina fadada historicamente ao fracasso. Além de organizar conceitos e cenários, o livro traz dados e estratégias de comunicação com lições sobre como enfrentar esse momento, pretendendo ser um guia prático do que considera “o maior combate político desta geração”.

Formado em Jornalismo pela Universidade Metodista do ABC, Mestre em Comunicação pela Universidade de São Paulo (USP) e Doutor em Ciências Humanas e Sociais pela UFABC, Rovai já publicou, entre outros, os seguintes livros: Um novo ecossistema midiático: a história do jornalismo digital no Brasil e Midiático Poder: o Caso Venezuela e a Guerra Informativa.

Ele conversou com a Revestrés sobre eleições, momento político e, claro, fascismo.

Revestrés: Bolsonaro pode ser classificado como “fascista”? O que o caracteriza assim?

Renato Rovai: Sim. É um equívoco não classificar Bolsonaro como fascista ou, se preferirem, como neofascista. Ele utiliza os princípios clássicos desta ideologia-movimento. Bolsonaro faz política baseado no ódio, no preconceito, na perseguição, ancorado numa religiosidade sectária. É o “nós contra eles”, como define John Stanley no livro Como funciona o fascismo. É bobagem dizer que, por não ser nacionalista, Bolsonaro não é fascista. O novo fascismo é financerizado e comprometido com as novas dinâmicas de um capitalismo globalizado.

É um equívoco não classificar Bolsonaro como fascista. Ele faz política baseado no ódio, preconceito, perseguição, ancorado numa religiosidade sectária. O novo fascismo é financerizado e comprometido com as novas dinâmicas de um capitalismo globalizado.

Revestrés: Nas análises sobre a eleição de Bolsonaro muito se fala sobre uma incredulidade de que ele seria eleito e uma surpresa com sua eleição. Houve de fato algo surpreendente, uma vez que uma chamada nova direita ou extrema direita já avançava no mundo? Ou fomos nós que deixamos de observar a realidade concreta?

RR: Bolsonaro é filho da Lava Jato e do golpe contra Dilma. Ele cresceu como o candidato da antipolítica que enfraqueceu o PT, mas destruiu o centro, em especial o PSDB. De qualquer maneira, sua eleição foi também consequência da possibilidade que teve de se vitimizar e se afirmar como mito depois da facada em Juiz de Fora.
E também por conta da prisão de Lula e da delação de Palocci que, se não tivesse sido inventada por Moro, no final do primeiro turno, poderia ter permitido uma melhor votação em Haddad. Mesmo com tudo isso, se Lula tivesse sido candidato em 2018, muito provavelmente Bolsonaro não se elegeria.

Se Lula tivesse sido candidato em 2018, muito provavelmente Bolsonaro não se elegeria.

Revestrés: O livro pretende ser um guia para derrotar o fascismo – em eleições e sempre. No entanto, há uma frase conhecida de Bertoldt Brecht que diz: “A cadela do fascismo está sempre no cio”. É possível uma proposta de derrotar o fascismo para sempre?

RR: O livro é um guia antifa de como derrotar o fascismo nas redes. O ‘sempre’ talvez seja mais um recurso retórico. Eu mesmo não gosto. Preferia que fosse apenas Como Derrotar o Fascismo nas Redes – me parece mais objetivo em relação ao que o livro é. Mas fui voto vencido (risos). O neofascismo tem como seu principal território de disputa a Internet. Bolsonaro teve 18 segundos de TV em 2018 e se filiou a um pequeníssimo partido. Ninguém acreditava que só com aquilo ele teria chance na disputa. Mas a Internet e seu uso baseado em fake news lhe deu a vitória. No livro nós explicamos como isso aconteceu e como podemos, a partir da ação coletiva e colaborativa, enfrentar e derrotar esse fenômeno.

Os jovens são os principais protagonistas do antifascismo. Eles estão construindo uma nova agenda nas redes e se impondo nos partidos progressistas.

Revestrés: Na sinopse do livro vocês dizem que este é maior combate político desta geração. O que se pode esperar que façam para derrotar o fascismo?

RR: Os jovens já estão nesta batalha. Eles são os principais protagonistas do antifascismo. Tanto que é entre o público de 16 a 24 anos que Bolsonaro tem seus piores resultados nas pesquisas. A geração millennial (nascidos entre a década de 1980 até final do século XX) está construindo uma nova agenda nas redes: defesa do meio ambiente, desenvolvimento sustentável, participação política mais democrática, defesa do feminismo, dos lgbtqia+, combate ao racismo etc. Essa agenda mais jovem está se impondo nos partidos progressistas e metade das mulheres que o PT vai lançar pra deputadas no Brasil são negras. Isso era impensável há um tempo atrás. Além disso, muitos dos ícones pops como Anitta e Felipe Netto, por exemplo, estão na luta para derrotar o fascismo.

Revestrés: Comportamentos fascistas, machistas, preconceituosos, parecem capazes de contaminar outras pessoas, que se sentem estimuladas a reproduzir esses comportamentos. Por que isso acontece?

A base do fascismo é o homem comum – que se sente frustrado por não ser valorizado e nem ter aquilo que lhe parece de direito.

RR: A base do fascismo é o homem comum – e quando falo homem aqui também tem a conotação de gênero – que se sente frustrado por não ser valorizado e nem ter aquilo que lhe parece de direito. Se o Estado e as instituições não estiverem muito atentos pra que esse cidadão não passe a pautar a vida pública, com a sua violência, o fascismo floresce. Por este motivo é importante saudar a coragem do ministro Alexandre de Moraes na defesa do Estado Democrático e nos limites que tem imposto aos golpistas e extremistas. Essa vigilância tem que ser constante.

Revestrés: Estamos esperando muito da via eleitoral, no entanto ela elegeu Bolsonaro e outros tantos políticos antidemocráticos. Estamos sendo ingênuos ao continuar investindo em eleições?

RR: Não estamos sendo ingênuos e não há outra possibilidade para o Brasil. Este é o caminho que temos que construir, tensionando seus limites. A democracia – principalmente a liberal – é um sistema imperfeito, mas temos que assumi-la como nosso campo de disputa.

SERVIÇO:

 

Lançamento em Teresina do livro Como Derrotar o Fascismo: em eleições e sempre

Por Sergio Amadeu e Renato Rovai

Com a presença de Renato Rovai

Dia 29/08/2022 (segunda-feira), às 19h,

no auditório do Hotel Uchôa

Rua Barão de Uruçuí, 340, Bairro Noivos.

Realização: Pensar Piauí, Piauí Hoje e Revista Revestrés.

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