Há cerca de seis anos – completados no próximo outubro – a equipe da revista carioca piauí leva a seus leitores um conteúdo que vai muito além das notícias factuais. Uma revista que prova que, se existe um gênero de publicação que sobreviverá a crise do impresso, é simplesmente aquele que prioriza o hábito de ler. 

Engana-se quem pensa que só cultura ou literatura recheiam a piauí. Segundo o documentarista e idealizador da revista, João Moreira Salles, o que a piauí faz é “contar bem uma história”. O próprio chegou a afirmar algumas vezes que o rótulo de “revista literária” incomoda: “Soa pretencioso. Parece que queremos nos aproximar da eternidade da literatura”. 

Quando o leitor chega satisfeito ao final de uma história cujo assunto não lhe interessava ao começar a ler, todos da piauí dormem com a sensação de dever cumprido. É que além de informação, o verdadeiro foco está no prazer da leitura. E a fórmula não muito convencional tem funcionado: a piauí vende em média  15 mil exemplares por mês nas bancas de todo o país, tem 21 mil assinantes e a tiragem fica por volta de 60 mil exemplares por edição.   

Para desvendar um pouco mais sobre a história da publicação mensal que leva o nome do nosso estado, entramos em contato por e-mail com a redação de piauí – no mesmo endereço eletrônico onde chegam diariamente centenas de textos de autores totalmente desconhecidos – inclusive piauienses.   

Fomos prontamente atendidos por Raquel Zangrandi, secretária de redação e também repórter da piauí, que se encarregou de encaminhar as perguntas a João Moreira Salles. Em um final de semana qualquer do último janeiro, o editor-chefe nos tirou algumas dúvidas e esclareceu de uma vez por todas o mito sobre o nome da revista. Com vocês, de piauí pra Piauí:  

 Nossa primeira pergunta diz respeito a um folclore. Muito se comenta por aqui sobre como teria surgido a ideia para o nome da revista. Algumas lendas foram criadas sobre este fato (uma delas diz que o nome Piauí seria o contrário de New Yorker) e agora queremos de uma vez por todas desmistificar isso: há realmente alguma relação entre o nome da revista e o nosso estado?

Sim e não. Em primeiro lugar, deixa eu desfazer os mal-entendidos. O nome não tem qualquer relação com a New Yorker e muito menos seria um comentário irônico sobre o Piauí. O título me veio à cabeça por causa de uma passagem do Gilberto Freire. Ele dizia (um tanto levianamente, segundo me informaram depois) que a língua dos países tropicais é cheia de vogais. A vogal seria redonda e amaciaria o idioma. Nos países frios aconteceria o contrário: lá, as palavras sairiam da boca cheia de pontas e cotovelos, um efeito do excesso de consoantes. Linguisticamente parece que isso é uma bobagem, mas gosto da ideia. Ela me ficou na cabeça. Piauí é uma palavra macia, à qual a gente se afeiçoa. Claro que a turma que ajudou a criar a revista sugeriu outros títulos. Aparecia um nome bacana, a gente se empolgava, mas a novidade não sobrevivia uma semana. E piauí ficava sempre ali, insistindo. Quando chegou a hora de bater o martelo, ele venceu. Aí entra uma segunda razão, que tem a ver com o estado. Pouca gente cobre o Piauí. Nesse sentido, a palavra representa o que não está no radar da imprensa, pelo menos daquela imprensa que se diz nacional. Portanto, a ideia do Piauí nos interessa – seja ele um estado da federação, um assunto, uma pessoa.   

Quantas pessoas fazem a Piauí? Há piauienses nesta equipe?

 Na parte editorial, somos 14. Nenhum piauiense. Mas também nenhum maranhense, amazonense, catarinense, gaúcho, mato-grossense do norte (do sul, tem). Então relaxem, que não é discriminação.  

 O Piauí já foi pauta da revista alguma vez? Se sim, em quais situações e quais foram as matérias?

 Várias vezes. Arrisco dizer que somos a revista nacional que mais cobre o Piauí. Espalhem, por favor. Já falamos do lançamento de um manual de fala & expressões piauienses, do enredo da Unidos de Lucas em homenagem ao estado, da visita ao Rio de especialistas piauienses em gemas e pedras semipreciosas; já cobrimos uma exposição de fotografias sobre o Piauí em Paris, contamos a história da modelo Laís Ribeiro, reclamamos do Guia Quatro Rodas que omitiu o estado numa de suas edições; já tratamos do badminton que se joga por aí e publicamos poemas do Manoel Ricardo de Lima, nascido em Parnaíba. Isso é o que eu me lembro. Deve ter mais.  

 Como é produzir uma revista tão textual em tempos onde a discussão sobre o fim do impresso nunca foi tão evidente? 

De certa maneira, facilita as coisas, pois sobra espaço para a gente ocupar. Atendemos a um tipo de leitor cujas opções na banca vêm diminuindo ao longo dos anos. Eles nunca serão legião, mas existem em número suficiente para justificar uma revista como a piauí.  

  E os leitores piauienses da piauí? São muitos? 

Temos 197 assinantes no total, sendo 124 na capital e 73 no interior do estado do Piauí. Isso significa 7% da carteira do Nordeste e 0,94% com relação ao Brasil. 

A venda em bancas, por mês, fica em torno de 50 exemplares, em média, em todo o estado do Piauí. 

 A piauí é uma das poucas revistas do mercado editorial brasileiro a praticar o jornalismo literário. Recentemente uma pesquisa divulgou que o brasileiro está lendo mais. Isso prova que sempre haverá espaço para a publicação de vocês?

 Não sei se chega a ser uma prova, mas certamente é uma esperança.  

 

*Publicada na Revestrés#01 em fevereiro/março de 2012.