Num dia desses, eu gastei algum tempo tentando desenrolar alguns imbróglios linguísticos para um aluno que havia acabado de se submeter a uma prova de concurso público. Ou seja, nada diferente do que faço todos os dias há muitos anos. O que chamou a minha atenção foi o fato de o aluno ter se comportado de maneira diferente. Ele, ao fim da minha explicação, chegou à conclusão de que a língua portuguesa não deveria ser “tão complicada”, já que é ferramenta de uso diário e algo necessário à sobrevivência em comunidade. Concordei com ele parcialmente, pois é certo que a língua portuguesa figura como nossa companheira diária, porém não compartilho do julgamento que pinta o nosso idioma como o Labirinto de Creta, com a gramática protagonizando o Minotauro, devorando o desguarnecido concurseiro. Durante um breve discurso meu acerca da importância de passar a lidar com as regras gramaticais sem bloqueio, sem resistência, sem rancor, ele me interrompeu e, parecendo ter plena convicção do que iria dizer, lançou esta pérola: “A gramática devia ser aprendida em apenas três minutos”. Na hora, pensei em desistir dessa conversa que não parecia ter futuro proveitoso. Parei um tempo, matutando… como concentrar todas as diversas regras da língua num recado de três minutos? Aquilo ia tomando um ar de desafio e, num devaneio, cheguei a conjecturar possíveis combos os quais serviriam como um padrão único para cada conteúdo da gramática. E assim foi o decorrer daquele dia, uma incessável marcha em busca do Santo Graal. Obviamente, depois desse período onírico de uma perfeita quimera, reconheci que a magia da língua portuguesa está, em parte, exatamente na impossibilidade de ser dominada, como uma fênix incontrolável e imortal. É, meus amigos, para aqueles que são amantes da língua, a insubordinação é o combustível pra admiração, quase beirando o delírio.
Dominar a língua e suas entranhas seria atingir o próprio Nirvana, e eu não sei se estaríamos preparados para tanto. Foi assim que aceitei a fatídica validação de nossa pequenez diante do idioma. A imensidão da língua é legítima e deve ser respeitada, ela se agiganta como Polifemo (retirando a parte do olho furado por Ulisses). Pois bem, encontrei novamente o aluno que tirara a minha paz, mas dessa vez eu estava preparado para uma resposta. Ele me avistou, cumprimentou-me e me indagou sobre o sucesso ou o fracasso de minha missão. Eu havia começado a montar um cenário para justificar a impossibilidade daquilo, quando percebi que ele estava mais interessado no resultado do que na explicação, então fui direto ao ponto e declarei que a língua portuguesa não se renderia a uma análise de três minutos, porque, se assim fosse, não seria um idioma, seria um Miojo. Ele parou um segundo e depois caiu na gargalhada, rimos juntos inevitavelmente. Você, concurseiro, acadêmico ou secundarista, não deve investir energia tentando controlar o incontrolável. Se for pra criar uma analogia, compare o conhecimento da língua portuguesa ao Às de Copas. No Tarô, ele representa sucesso e realização de sonhos planejados, ou seja, não é pra qualquer um, mas se o tiver e souber usá-lo, vale mais que um Royal Straight Flush !!!