Faz calor, a luz entra pela janela e parece uma pintura.
Escuto o eco da bola batendo no chão da quadra da cidade, a carne seca ao sol, o vento é quente, a música alta.
Logo ali, cruzando o rio, fica o Piauí.
Tempo suspenso em fronteira.
A estrada é de areia, é de erosão.
Foram duas pernoites.
Palmeira buriti, sinuca, crianças – o porco Tito vai virar comida no verão, em Julho.
O altar é para a água.
“Água é sangue”.
Durante a noite, lampião, forno a lenha e galinha caipira… O rio corre logo ali.
A idade aparece na pele queimada de sol. Às vezes, o trabalho arde.
No Matopiba eu vi o tempo da natureza contra o tempo da produção em grande escala.
Por aquelas bandas, a monocultura é o horizonte voraz.
A aceleração, a precipitação, a pressa da produção.
Já não chove como antes.
Mas a luz ainda entra como pintura, a água brota da areia, percorre a vereda,
é o chão fluente que ergue o buritizal.
Mayra Azzi é fotógrafa e videomaker. Residente em São Paulo, formou-se em Artes Plásticas e Direção de Fotografia, dedicando-se a projetos na área da cultura. O ensaio “O Tempo das coisas” é parte de um projeto em andamento, realizado com Camila Vargas Boldrini e Vanessa Mendes na região de fronteira agrícola do Matopiba (Maranhão, Tocantins, Piauí e Bahia).
Publicado na Revestrés#40 – março-abril de 2019.