(ou o 10)

Rita Hayworth soube por amigos em comum que Virginia compartilha com ela seu maior desejo: aumentar as noites para conseguir enchê-las de sonhos. Mas noites são seres fugidios que escorregam pelo mundo antes que possamos abrir suas barrigas e mergulhar dentro delas profundamente e colar em suas paredes todas as estrelas que iluminam nossos céus. “Nessun dorma, nessun dorma”, mas mesmo que não se durma nessa cidade em uma noite de terça-feira ninguém vê que Rita Hayworth carrega pela Lardennois sua cadeira de espaguete blêblanrúge, sobe os degraus de seu perfeito esconderijo e, com alguns passos à direita, chega ao lugar onde mais se encontra com ela mesma. Rita Hayworth se senta, tirando antes do bolso traseiro um pequeno papel dobrado. É uma canção antiga, que a mãe da mãe da mãe de Rita Hayworth cantava para o irmão mais novo dormir, e que diz mais ou menos assim: “eu quero amor, alegria, bom humor, não é o dinheiro que me trará felicidade, eu quero morrer com a mão no coração”. Rita Hayworth sobe na cadeira, espeta com um alfinete de cabeça amarela o bilhete no céu, senta novamente e espera o sol nascer. Já é quase dia, e Rita Hayworth agora caminha de volta pela Lardennois retirando pedras dos bolsos do casaco. A cada pedra que retira e joga por cima do ombro Rita Hayworth dá um sorriso e diz baixinho: venci outra vez. Treme seu celular. É Virgínia.