Criptomaníaco – sou. E o que anuncio:

decifro qualquer esfinge.

Há quem acredite.

Mas, para dizer a verdade, minto.

É que a falácia muitas vezes

encanta os incautos.

E vou me divertindo como posso.

Contemplo estrelas em voo rasante.

Vejo mulheres instantâneas,

que dissolvem sem foder.

Desprezo pessoas térreas.

Ouço cintilar o aço das canções mais belas.

Amo um rosto que oscila a lucilar à luz solar.

E sei que todo telhado é de vidro.

Que todos os gatunos são pardos

nas noites brasileiras.

Que palavras me faltam

para agradecer

o que assassinos e suicidas

fazem por mim.

Em dias raros, no entanto,

sou quem destrama os fios,

quem desata os rios da meada,

quem refaz os riscos da memória,

quem duvida da vida

e desmente a morte.

Nesses dias,

astros brutais me revelam estupros astrais,

chagas de vulcão, segredos oceânicos

diante dos quais

até as mais estranhas trevas estremecem.

Mas, para que a gravidade não me tome

e escravize, volto logo ao jogo.

Numa infração de segundo,

recodifico fêmeas efêmeras.

E sou uma explosão de risos

girando em torno de nada.

 

(Publicado na Revestrés#31 – Junho/Julho 2017)