[Foto: Maurício Pokemon]

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De onde vem tua história com a Arte? Do ventre, eu acho. Nasci melada de barro. Em minhas lembranças de infância eu vejo um banquinho de madeira meio capenga uma boneca, talvez, e metade do corpo dela amarrado pelo avental, aquele que fingia proteger da poeira que a argila levantava. Aquele era o meu acalanto, o cheiro, as mão secas, por vezes a sensação de nojo. Lembro também das folhas das tarefas da escola que sempre levavam um pouco do tom cinza que dali tomava de conta.

Sempre me disseram que eu iria seguir os passos dela. Eu sempre me imaginei gigante para tal feito. Uma utopia, um folclore porque teria que ser com aquelas mãos, aquela força que emanava dos seus olhos enquanto eu observava aquela sinergia entre ela e o que produzia. Dessa forma a arte para mim não virou uma ambição, ela é minha mãe, ela é essa mulher que se traduz em vida.

Falar de minha mãe é falar do que mais profundo existe me mim e também do que mais profundo há na história da Arte e das mulheres em nosso Estado. Seria muita pretensão minha achar que só eu, dentre 5 filhos apaixonados, dentre uma história de luta e conquistas que cativou e a cada dia cativa e surpreende ainda mais quem conhece o seu trabalho, posso mensurar a grandiosidade de Fatima Campos. Escrevendo assim, lembrei de quando ela assinava minhas notificações na escola, eu parava para admirar aquele desenho tão doido e pensava: porque tanta energia numa simples assinatura? E não minto, tentei falsificar algumas notificações que me trariam broncas, mas era impossível!

Essa energia vem mesmo da terra, da Tatu Fêmea, das Ducarmos, das mulheres guerreiras que nunca tiveram medo da piçarra de nosso sertão. Essa energia toda, que construiu sua história com bravura e delicadeza, vem das raízes de um chão do interior do Piauí, onde, sem mistério, soa o chamado do boi, sente o cheiro do cabrito, saliva o sabor da Guabiraba e molha no xuá da cachoeira.

* Fátima Campos é artista visual desde a década de 70. De União (PI), especializou-se em cerâmica e já participou de várias exposições coletivas e salões.

** Marina Medeiros é artista visual e professora do Ifpi. Tem realizado curadorias de exposições e coordenação de projetos nos espaços culturais.

(Publicado na Revestrés#25 – Junho/Julho de 2016)