A ideia de República é a de separar os poderes segundo suas competências. Montaigne os dividiu, oficialmente, em Executivo, Judiciário e Legislativo. A partir da Revolução Francesa, quase todos os países acordaram para essa composição política em suas constituições. Disso todos sabemos, mas o que temos visto é completamente diferente.

Em nosso país o Poder Executivo tem predominado sobre os outros dois. O Poder Legislativo somente aos poucos começa a sobressair e o Judiciário tem ficado como que obscurecido. Recentemente, o jogo político tem ficado mais pesado. O Legislativo tem procurado determinar os destinos da nação em uma queda de braços com o Executivo. O nosso sistema de governo por coalizão tem produzido tumulto político que vai desestruturando a estabilidade política do país. Para governar é preciso que o partido no poder negocie com os demais partidos políticos para que as leis e decretos possam ser votados a seu favor. Nessa queda de braços, o mérito não tem sido a natureza, a essência dos projetos que estão para serem julgados. Antes é o que o projeto representa em termos de poder para cada um dos trocentos partidos políticos que compõem o Legislativo.

O país não importa, importa o poder. O controle das rédeas políticas. Porquê? Porque é exatamente nesse ponto que está a possibilidade da apropriação indébita dos bens da nação. O homem comum é egoísta e tem pequena capacidade para renunciar a vantagens em prol dos outros, da comunidade humana. Ele não é cruel e muito menos mau. Apenas não tem a noção do sentido e da importância dos outros em sua vida. Perdido dessa noção, se coloca como centro do mundo e reza pela cartilha do individualismo. Acredita que a fortuna financeira que possa amealhar irá livrar sua vida, e dos seus familiares, dos males possíveis que da existência fazem parte. E, se esse homem comum chegar ao poder, pode provocar mal incalculável. O homem ordinário com poder extraordinário, é extraordinariamente perigoso para toda a humanidade.

Os ideais sociais da República de uma vida que escape da necessidade, da miséria e da fome para todos que vivem sob seu ideário, é totalmente solapado pela prática de mercado. O mercado (os bancos aí incluídos) é destituído de humanidade, embora sejam seres humanos que o manipulam. Ele acaba por fugir ao controle e se constitui em uma máquina devoradora do que a sociedade produz de melhor. Estabelece ideologias. Ter para ser; consumismo; individualismo; salve-se quem puder; cada um para si e deus para todos; neoliberalismos; meritocracias; e outras.

Aos legisladores caberia criar leis que controlassem o mercado em sua atuação lesiva à sociedade, como o Código Penal controla a ação criminosa. O poder Judiciário para interpretar e julgar as penalidades inerentes às leis e o poder Executivo para aplicar essas leis. Mas o mercado, dada sua capacidade financeira e midiática, acaba por controlar os três poderes capturando a ambição dos detentores de tais poderes. O financiamento das campanhas políticas e vantagens econômicas são os principais meios pelos quais procedem os controladores do mercado. Para que eles financiariam campanhas políticas e negociariam vantagens econômicas, senão para proveito próprio? Ficam óbvios demais seus motivos.

É o chamado capitalismo de mercado que dá as cartas e joga de mão, endurecendo o jogo político e solapando os poderes da nação. Os políticos, cada vez mais ousados por conta da punidade seletiva, estão ai, exercendo seus podres poderes. E mesmo com inúmeros processos de improbidade administrativa, corrupção ativa e passiva, lavagem de dinheiro, negociações espúrias, capitais acumulados em outros países e malversação do bem público.

Recentemente a República foi golpeada quando a Presidente eleita pela maioria dos eleitores do país foi afastada do poder. Os que a derrubaram do poder e a sucederam, em sua maioria, são os políticos mais comprometidos com processos, como os citados acima. Estão implementando medidas que prejudicarão os avanços sociais do país. E a República ficou em uma “sinuca de bico”; caso prossiga o governo interino, esse não tem representatividade para exercer o poder. Voltando a Presidente legítima, seus opositores se unirão impossibilitando-a de governar. Novas eleições, além de inconstitucional, ainda seria trocar seis por meia dúzia com esse mesmo sistema eleitoral. A única saída seria uma reforma estrutural na política da nação e depois então novas eleições. Mas quem comandaria? Não temos. Homens comuns estão no poder…

**

Luiz Mendes

27/07/2016.