Tenho acompanhado essa superexposição da violência que vem ocorrendo. Fico pensando sobre o que será que está acontecendo. Parece que explodiu uma incontrolável onda de agressividade, como que nascida do ar que respiramos. Do nada. Penso nas pessoas que são assassinadas e massacradas todos os dias. Imagino que isso não é uma onda apenas, qual uma epidemia que vem ao sabor dos ventos. Qual o valor de uma vida? As chacinas já quase nem aparecem nos noticiários; só quando são de dezenas de pessoas. Os corvos, que vivem de comentar desgraças alheias, não dão mais importância. Somente o que soma pontos de audiência importa.
Eu fico pensando qual é o processo de criação de toda essa violência. Será que existe mesmo um processo, uma criação? De certo, a que reflete minimamente, salta aos olhos que isso tudo não nasce de uma geração espontânea. Não aparece assim da noite para o dia. Embora os meios de comunicação esforcem-se por demonstrar que, mesmo combatida com todos os meios legais, a violência prolifera qual erva daninha, alimentada por si mesma.
A escola antropológica italiana, cujo maior expoente é Cesare Lombroso, atribui ao indivíduo e a seus ancestrais a culpa do comportamento violento. Procuram demonstrar, exaustivamente, que a violência se desenvolve por si mesma e possui um poder de autocriação que supera qualquer possibilidade de contê-la. Os meios de comunicação parecem aderir a tal visão sociológica. Sob esse ponto de vista, quem pratica a violência é desumano, naturalmente perverso, mau e encontra prazer no que faz. Um psicopata que não ama ninguém e só pensa em si. Alguém à margem da sociedade dos humanos, quase uma ave de rapina. Como tal, deve ser excluído ou separado para sempre do convívio humano. Uma visão, sem dúvida, bastante simplista e destituída de bases científicas.
Já a escola sociológica francesa considera a violência não mais como um fenômeno individual. Observa como uma ocorrência coletiva e global. Nos faz a todos responsáveis pela violência existente. Quetelet é seu representante mais divulgado. Os especialistas indicam que o perfil social dos que violam a lei não difere do perfil social da população mais empobrecida. Criminologistas modernos como Abreu, Bordini, Brant e Adorno, esforçam-se por demonstrar que a crença de que o homem violento possui uma natureza anti-humana não se sustenta em qualquer pesquisa ou estudo.
Cientistas sociais, como Max Weber, afirmam que a razão dos pequenos criminosos esta diretamente relacionada com a dos grandes criminosos protegidos pela impunidade que lhes proporciona a sociedade por eles controlada. Apropriam-se do produto de toda sociedade e exercem eficiente vigilância e repressão sobre os expropriados. O Estado, tal como é manipulado pelo poder econômico, é o protetor dos grandes criminosos e gerador da criminalização geral. O Estado não consegue resolver o problema da violência porque é o seu criador e mantenedor imediato.
São gerados fatores criminógenos na sociedade que promove a criminalização e a violência na população mais desfavorecida. E tais fatores ficam evidentes na deficiência das políticas de distribuição de renda; na vergonhosa administração das verbas públicas; na falta de lazer para os jovens nas periferias das grandes capitais; na falência do sistema de saúde para a população; na escola que apenas ensina o básico mas não educa a criança para a cidadania. A segurança e a lei dirigidas para proteger quem tem de quem não tem; a propriedade privada das terras produtivas em mãos de uns poucos latifundiários, etc.
As instituições sociais, cujo dever seria combater e eliminar fatores tão nocivos à existência humana, estigmatizam as vítimas colocando-as como potencialmente criminosas. O favelado, o desempregado, o homossexual, o negro, o nordestino, o egresso das prisões, etc. Quem duvida, esteja presente a uma batida policial a uma favela ou a bairros dos extremos das grandes capitais.
Quem são os maiores responsáveis pela produção de drogas? Só não percebe quem não quer pensar. Sim, porque a droga não é produzida em quilos por manufaturas de fundo de quintal. Exige grandes extensões de terras férteis, adubos, tratadores e colheita. Depois tem a parte do laboratório, que não lida com pouca mercadoria, pois é antieconômico. Em seguida vem a embalagem, transporte e a distribuição.
Quem banca tudo isso? O laranja da esquina com seus papeis batizados? São grandes financistas e especuladores financeiros que movimentam tais mercados. E não o fariam, caso não tivessem certeza de impunidade. Julgam-se inatingíveis. São cidadãos eminentes, com reputação social.
As prisões estão lotadas de microtraficantes que promoveram a riqueza desses grandes criminosos. Essa jamais foi a solução. Políticos clamam por sentenças de prisão perpétua e penas altíssimas. Governadores buscam encher as ruas de policiais, como se isso resolvesse o problema da violência social. Os partidos rivais ao governo aproveitam-se da ocasião para se promoverem em cima da fragilidade governamental. Dizem absurdos em busca de convencerem a opinião pública de que eles são melhores e resolveriam a questão com medidas de força e coragem.
Os donos reais do poder, os votantes, são os únicos que podem fazer alguma coisa. Mas são tantas idas e vindas, tantos prós e contras, em quem confiar, em quem votar? Não sei. Apenas acredito que penalizar a vítima jamais será a solução. É obvio que é preciso policiar e punir. Mas também é preciso um trabalho sério de urbanização e educação junto ao pessoal da periferia e subúrbios. Principalmente investir pesado na juventude do país. No fundo, é preciso muito amor ao Brasil e principalmente aos brasileiros.
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Luiz Mendes
30/08/2015