Você já ouviu falar em “Complexo de Cassandra”? Pois é, sou curioso até encher o saco. Nem sempre me aguento com minhas pesquisas; elas sempre são copiosas. Então, outro dia li algo sobre isso e fui atrás, saber o que viria a ser aquele nome tão bonito e sonoro (sou metido a poeta, também).

Mas ao tomar conhecimento da definição, fiquei rindo de nós todos, seres humanos. O homem é o mesmo em qualquer condição. Em resumo, o tal “Complexo de Cassandra” nada mais é que um método de sobrevivência prisional dos mais eficientes. Estou vivo e inteiro (emoção e razão afiados, embora a paixão e a insanidade comum a todos) graças a ele. Popularmente, chamamos a isso jogo de cintura.

Diante de uma questão sem solução que nos atinge, primeiro é preciso estar convicto de que não é possível evitar o problema. Depois, então, é preciso agir em consequência disso. Talvez assim seja possível escapar, se houver chances. Só que, na prisão, o espaço é limitado e o ambiente controlado artificialmente. Então é preciso assimilar o fato como real e admitir que só a observação centrada nos acontecimentos trarão alternativas viáveis de sobrevivência. Mas só os que determinam e os que executam as sentenças sabem de fato o que vai acontecer com o apenado. Aqui fora é o medo que tange, limita o espaço e controla o ambiente. Diante dos desastres anunciados como inevitáveis pela ciência, o medo passou a ser tido como o único caminho viável para as pessoas.

A pós-modernidade pressagia o fim dos tempos. Segundo profetas pós-modernos, seremos destruídos pelos nossos esforços em controlar o planeta. Na busca de alicerçar conhecimentos para sustentar o futuro, acabaremos por nos expulsar do “paraíso” que construímos. Acreditam que já cortamos a relação com a nossa história, como quem corta os pulsos e espera sangrar até morrer. Já nos matamos enquanto humanos; somos moribundos a caminhar sem destino (os filmes já nos mostram os “zumbis”), sem futuro e agora também, sem história.

Em consequência, eles não reconhecem nenhum dos valores que até então orientaram nossos caminhos. Afirmam que fomos nós que nos levamos à autodestruição em que já mergulhamos. Concluem que a razão humana somente fez mal ao homem, provocando guerras, doenças e, finalmente, a destruição do planeta. São os anjos anunciadores de catástrofe eminente.

É preciso consciência de que, provavelmente, tenhamos mesmo já destruído o planeta. Os valores antigos, esses mesmos ai, pragmáticos, de competição, “fique rico ou morra tentando”, economia de mercado, individualismo, consumismo absurdo, desmatamentos predadores, poluição do ar e das águas, guerras, divisão de classes sociais e outros, realmente nos tem feito muito mal, senão todos os males. Mas daí a ficar esperando o fim para agir em consequência, não existe. A consequência do fim é nada haver. Parece com o que acontece na prisão em que o controle da vida dos homens aprisionados vem de quem os custodia. Aqui fora há campo. Tudo é plástico, em permanente transformação; se aprendemos a destruir, com certeza aprenderemos a construir também. É dialético. Ao final e ao cabo, o que vai valer mesmo será o gesto, a alegria, mesmo que dolorido, sofrido e indigesto.

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Luiz Mendes