Homenagem póstuma a Silvania Silveira.

E já vão longe os dias de domingo em que eu amava o amor que me abençoava e dava vida à minha vida. Domingos febris. No sábado, como no Pequeno Príncipe de Exupery: “se vens às 4, às 3 já estarei feliz”, eu já vivia o estupor da felicidade. Após a faxina vigorosa na cela, de jogar água fervente até no teto, recolhia-me a cuidar do meu melhor uniforme de prisioneiro. Dobrava do modo mais perfeito possível e colocava embaixo do colchão, para “passar”. O pensamento voava até aquele ser tão completamente amado e a alma palpitava o coração inseguro: será que ela vem? Por mais suas cartas afirmassem que viria, ainda a dúvida cortava em tiras a alegria da aproximação do domingo. Mil coisas podiam acontecer, como já haviam acontecido naqueles anos todos em que ela me visitava. O coração se apequenava e a seda do fio de esperança se agarrava às bordas do pote da angústia que fervilhava. Tentava distrair a mente, tentava pensar, variar, ler, estudar, mas esta, inquieta, teimava em me espremer, torturar. Não dormia, apenas desmaiava de sono. Pela manhã estava aceso como uma árvore de Natal, agitado, nem tomava o café direito. As horas (ah! Insuportáveis horas de espera…) não passavam; se arrastavam como cobras velhas e doentes. Então, como se fosse uma benção dos céus, estava na hora dela chegar. Juro que era difícil acreditar que, mais uma vez, eu conseguira chegar até aquele momento mágico. Ficava ali no corredor dos desesperados que esperavam, como eu, com a alma nos olhos e as mãos trementes. A cada visitante que entrava, o coração saltava na boca: e quase nunca era ela. Até que, de repente, não mais que de repente, como diria o poeta, surgia aquele ser encantado que eu já nem acreditava que existisse de fato. As pernas bambeavam. E quando ela me avistava, corria para mim com seus olhos brilhantes. Nunca ninguém me olhou com tanto amor e eu bebia daqueles olhos escuros, o néctar mais precioso. O calor de seu corpo me trazia novamente à realidade e saíamos dali grudados qual fôssemos apenas um. Eu nem sentia o chão sob meus pés. Não estava mais preso, ela era minha liberdade, tudo soava como poesia e eu, encantado, subia as escadas para ser feliz.

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Luiz Mendes

31/12/2015.